sábado, 17 de abril de 2010

Interfaces 3 – PARQUES DE EXPOSIÇÃO AGROPECUÁRIA

Interfaces Antropologia e História do urbano. CIDADESSERTÃO: A CIDADE RECEBE E ACOLHE O SERTÃO: 3 – PARQUES DE EXPOSIÇÃO AGROPECUÁRIA

Carcará
Lá no sertão
É um bicho que avoa que nem avião
É um pássaro malvado
Tem o bico volteado que nem gavião
Carcará
Quando vê roça queimada
Sai voando, cantando,
Carcará
Vai fazer sua caçada
Carcará come inté cobra queimada
Quando chega o tempo da invernada
O sertão não tem mais roça queimada
Carcará mesmo assim num passa fome
Os burrego que nasce na baixada
Carcará
Pega, mata e come
Carcará
Num vai morrer de fome
Carcará
Mais coragem do que home
Carcará
Pega, mata e come
Carcará é malvado, é valentão
É a águia de lá do meu sertão
Os burrego novinho num pode andá
Ele puxa o umbigo inté matá
Carcará
Pega, mata e come
Carcará
Num vai morrer de fome
Carcará
Mais coragem do que home
Carcará


(João do Vale/José Cândido – “Carcará”)



Parques de exposição agropecuária são oportunidade ímpar de, anfitriã, a cidade receber e acolher o sertão. Durante dias, um espaço urbano se transfigura em festa cultural onde valores, animais e objetos típicos do Sertão são expostos aos olhos curiosos de crianças e adultos.

Leilões de animais se transformam em pontos de encontro (e de negócios) de criadores e, ao mesmo tempo, em espetáculo para olhares urbanos mais chegados à volúpia silenciosa dos shopping centers. Pequenas charretes puxadas por póneis conduzem a gente urbana, sobre asfalto e pistas de cimento, a universos imaginários que quase fazem esquecer a pressa que impulsiona os veículos ali adiante. Rodeios são apresentados como alternativa a espetáculos formais e nem sempre tão alegres que colocam os habitantes da cidade frente a frente com um modo de viver e de adoçar a vida sertaneja.

Baias expõem cavalos, os mais vistosos e bem cuidados que sequer dominavam os sonhos urbanos para além da virtualidade digital das telas de TV. Mudas de plantas raras para o verde urbano e pássaros coloridos demais para as cores urbanas são os arautos de uma orgia sertaneja dos sentidos. Uma apoteose onde não faltam os odores característicos de currais e de animais, músicas sertanejas comme il faut, insistentes nos autofalantes, apresentações ao vivo de artistas e de suas musicalidades estranhas aos ouvidos litorâneos, máquinas e veículos que auxiliam o labor e aumentam a produtividade do mundo rural. Cada coisa e todas as coisas gritam unidas para convencer nosso espírito cético que estamos no outro mundo.

Por um momento, nossa imaginação nos sequestra dos dissabores urbanos, em desfile no mundo cinza de muros, galpões e pisos, e as boas vindas efusivas da cidade ao sertanejo - “antes de tudo um forte” - se traduzem num abraço tão forte e tão íntimo quanto capaz de confundir quem é abraçado e quem abraça … até que nos deparamos com bares, lanchonetes e seus mobiliários de plástico a nos convidar, nem sempre com modos sutís, ao mergulho num mundo de onde na verdade nunca saímos: o mundo urbano.


Amanhã, domingo, último dia do evento em Salvador. E já se fala em setembro, na "Princesa do Sertão" que também atende pelo nome de Feira de Santana.

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