domingo, 14 de março de 2010

DOMINGO É , MESMO, DIA DE PESCARIA?

DOMINGO É , MESMO, DIA DE PESCARIA?

Domingo é dia, de pescaria, oi
Lá vou eu, de caniço e samburá
Maré tá cheia
Fico na areia
Porque na areia dá mais peixe, que no mar.

(bis)

Todo bom pescador, ama o sol
Todo bom pescador, pesca em pé
Não precisa pescar de anzol
É só com os olhos, feito jacaré... é.


(“Pescador “, Haroldo Lobo e Milton de Oliveira)


Esta marchinha, que fez a alegria dos foliões dos Carnavais de clubes e de rua de 1953, 1954 e de muitos anos depois (quando o trio elétrico de Salvador era novidade de três anos de existência), fala da atividade de pescar não como um exercício profissional mas uma prática de lazer, um hobby dominical.


“Pescador” fala também que na areia dá mais peixe, que no mar e que “Não precisa pescar de anzol”/ “É só com os olhos, feito jacaré... é”. Em 1953 e anos próximos, as mulheres de rosto bonito e de corpo exuberante (tipo “violão” como se avaliava então) recebiam uma certa classificação: “peixe”. Dizia-se, naqueles anos: Aquela mulher, ou aquela dona, é “um peixão” Um dos mais poderosos sonhos de consumo de meados do século XX era um automóvel muito grande, cujo desenho do enorme porta-malas lembrava um peixe; daí o nome popular “rabo de peixe” para esses veículos. As ilustrações publicitárias que objetivavam ajudar a vender esse tipo de automóvel (cigarros, cervejas ...) mostravam sempre uma mulher tipo “peixão” com nádegas expressivas ao lado do tal carro “rabo de peixe”. - Precisa falar mais alguma coisa? – Não, não precisa.


Quando, num domingo, um pescador ou a tripulação de um navio pesqueiro vão ao mar, certamente não irão se divertir. Vão pescar e, depois, vender os peixes – existe uma finalidade econômica aí. Inclusive porque a palavra divertir significa, em suas origens, desviar-se do que é realmente importante. Um pescador amador e , dominical com uma vara ou um equipamento de mergulho, aí sim ... eis alguém praticando uma atividade de lazer, alguma coisa, como dizemos, para ‘desestressar’, “curtir”, “relaxar” ...

Domingo lindo,
Tarde de sol, pego o anzol,
Ligo a lancha, vou navegando,
Para o farol,
Mal eu chego,
Vejo e sossego, o mar nem pisca,
Estufo o peito,
Faço pose, jogo a isca.

Mas os peixes não querem cooperar,
Se eu não pescar nenhum,
Com que cara vou ficar,
Vou depressa,
E compro peixe no mercado,
E enquanto o sol no céu, vai sumindo,
Eu volto sorrindo,
E mal um broto me vê passar,
Ouço sempre ela falar,
Se ele é bom pescador,
Serve pra ser meu amor.

(falado)
Enganei todo mundo,
Comprei o peixe,
Enganei até o broto


("A Pescaria” - Erasmo Carlos).


Sim. Mas domingo é, mesmo, dia de pescaria? Com a luta, diária e sempre alerta, para conseguir um lugar no mercado de trabalho – e nele permanecer -, com a expansão e a sobrecarga dos setores industrial, comercial e serviços – mas também a agropecuária, nem todo o domingo e nem para todas as pessoas domingo é dia de pescaria como diversão. Cada vez mais, ao menos no Brasil, se trabalha aos domingos: supermercados, shopping centers, trabalham aos domingos sem ter tempo de pensar sequer na guarda do Dia do Senhor ou no juízo final sob sua Presidência. Em muitos países europeus, o domingo é, coletivamente, ‘sagrado’. Os fortes apelos de consumo que concentram grandes massas, supermercados, shopping centers, estão fechados aos dominmgos; este dia é dedicado ao descanso, ao lazer, ao estar com familiares, amigos, vizinhos, um dia dedicado à leitura ... No estágio em que se arrasta o capitalismo brasileiro, sindicalistas têm que estar vigilantes para que patrões não soneguem o pagamento das horas trabalhadas aos domingos.



Algum tempo depois de estar morando no Paraná (Brasil), 1974, alguém me parou na rua e perguntou:

- E aí baiano, ta gostando do Paraná?

- (Eu): Estou gostando sim, é um estado muito bonito, muito verde, céu bastante azul ...

- E tá trabalhando muito?

(Eu): Estou sim. Estou trabalhando até dia de domingo. [eu ensinava, sexta, sábado e domingo, num curso tipo ‘supletivo’ para adultos em sua maioria trabalhadores rurais de diversas origens estrangeiras, alemães, russos, italianos ... ].

- E qual é o problema de trabalhar dia de domingo? Lá na Bahia ninguém trabalha dia de domingo não?

(Eu): Não, não há problema. Na Bahia, há muitas pessoas que trabalham dia de domingo.

- O senhor conhece o lema do Paraná?

- (Eu): Não, não conheço ainda.

- É assim: “Paraná, aqui se trabalha”

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