sábado, 27 de março de 2010

AGUAONIA OCULAR DE UMA CIDADE CEGA (5) - FINAL

AGUAONIA OCULAR DE UMA CIDADE CEGA (5) - FINAL
SECA, AGRESSÕES AMBIENTAIS E QUALIDADE DE VIDA EM
FEIRA DE SANTANA (BAHIA) - SÉCULO XIX - SÉCULO XX

Vicente Deocleciano Moreira
vicentedeocleciano@yahoo.com.br
vicentedeocleciano@gmail.com
http://www.viverascidades.blogspot.com

(FINAL)



A premência de dotar Feira de Santana de um sistema de abastecimento d'água ao menos alternativa aos serviços dos aguadeiros, obrigou que o Poder Público ensaiasse diversas tentativas de resolução - fracassadas, diga-se de passagem entre 1875 e 1917


Em 1875, a Câmara aprovou convênio entre o Municípi~ e os senhores Raimundo e Manoel Barbosã de Sena, visando a implantação de um sistema dé aquedutos.
Esse projeto, que tentava resolver o problema da distância entre a lagoa e as residências, nunca foi executado. Em outros exemplos, entre 1889 e 1917, diversos planos municipais que previam a construção de fontes públicas não saíram do papel; nem mesmo quando se cogitou, pela primeira vez, da instalação de água encanada, 1917, conseguiu-se êxito. Esta primeira tentativa (água encanada) buscava atrair a iniciativa: privada para modernizar o abastecimento. Os incentivos oferecidos pelo Poder Público, porém, não despertaram o interesse do empresariado.
Informação datada de 1897, dá conta da existência de uma bomba localizada no final da Rua dos Olhos d' Água, continuação da Praça Quinze de Novembro, que extrahe água para a via férrea central e próxima a linha do percurso. (O PROPULSOR, 13/03/1897) Outras ações governamentais desfilavam na luta contra a seca, inclusive em inícios do século XX, a exemplo de cataventos e perfuração de poços tubulares, iniciadas em 1912 em diversas praças. Em 1913, havia seis desses poços em Feira de Santana. Se, de um lado, o Governo buscava soluções as mais diversas, de outro, o povo se valia da escavação de poços para usos residenciais e comunitários.
Mesmo com água correndo nas torneiras residenciais e comerciais, ainda hoje casas e até restaurantes e hotéis se valem, paralelámente, da água do poço cavado no quintal.


Em 1912, os governos municipal e estadual, consorciados, estudaram a construção de uma barragem no rio J acuípe a fim dé que dela derivasse um açude para amenizar os efeitos da seca, principalmente sobre a agricultura. Nesse mesmo ano, o vereador Auto Reis propôs a intermediação do intendente num pedido ao Governador do Estado e ao Ministro da Agricultura para que fossem implantados em Feira de Santana sistemas de irrigação. A proposta foi aprovada por unanimidade. (FEIRADESANTANA, 1912). Naquelemes.mo ano,- a Jntendência Municipal recebeu proposta do Sr. Chagas Dória, presidente da Compagnie des Chemins de Fel' Federoux, de


levar os trilhos da Estrada de Ferro Central da Bahia à ponte da Navegação Bahiana na Cachoeira e a estabelecer um horário que permitia viagens directas da Capital à Feira de Sant'Anna
(FEIRA DE SANTANA, 1912).



Tal episódio foi avaliado como um "sinal de desenvolvimtmto" para Feira de Santana. Não fosse a frustração causada pela ausência de água encanada, este sinal seria pleno, com-pleto. Acreditava-se que à água encanada se seguiriam"m{:lhoramentos, "progressos", como iluminação e esgoto públicos ... numa cidade cuja população crescia a olhos vistos.


Em sua sessão ordinária (ainda em 1912), o Conselho Municipal deliberou a abertura de concorrência pública para o abastecimento d' água, argumentando porém que o Muriicípio não dispunha de condições financeiras para arcar com semelhante encargo. Poderiam concorrer empresas, companhias ou pessoas físicas. O proponente que melhores vantagens . oferecesse, receberia alguns benefícios... dentre ges o monopólio do abastecimento.


Em 1921, o Intendente Bernardino Bahia enviou mensagem à Câmara, alertando o Conselho para que medidas urgentes fossem tomadas a fim de resolver o problema da falta de canalização da água. O Intendente argumentava que a cidade era das mais belas e progressistas no setor comercial, sendo imprescindível este serviço. As comissões da Fazenda e Obras Públicas elaboraram projeto de lei (e apresentaram-no ao Conselho) que autorizava o Intendente a contrair empréstimo de quatrocentos contos de réís para as obras de canalização da água potável. Para realizar ôs estudos técnicos preliminares, o Intendente convidou o engenheiro Teodoro Sampaio. O engenheiro identificou, no lençol subterrâneo de Feira de Santana, . a viabilidade técnica (e econômica) do projeto.


Era a aguaonia de uma cidade, obcecada pelo "progresso", mas também dedicada à luta pela água tratada e de qualidade superior à das lagoas e fontes, vendida pelos aguadeiros. A água encanada era uma premente necessidade não só para residências, estradas, mas também para o Mercado Municipal (inaugurado em 1915, atual Mercado de Arte), principalmente nos dias de feira livre. Nesses dias, um maior número de pessoas exigia água com facilidade para beber, lavar pisos e balcões das barracas do Mercado e servir os sanitários... proporcionando maior higiene para o local.


De 1930 até final da década de 40, nosso levantamento encontrou um vazio de informações sobre abastecimento d' água no arquivo da Câmara Municipal de Feira de Santana. Isto se' deveu à supressão das câmaras municipais e outras instituições democráticas pelo governo de Getúlio Vargas. Em Feira de Santana, somente em maio de 1948 foi eleita uma nova câmara. .


Em 1951, a Associação Comercial de Feira de Santana solicitou, do Governo Federal, recursos financeiros para obras de água encanada e saneamento básico. Em fevereiro de 1952,' foi convocada uma sessão extraordinária da Câmara, em que o Conselho Municipal foi informado da doação de dez milhões de cruzeiros pelo Governo Federal para as mencionadas obras. Nos discursos de agradecimento pela doação, os vereadores ressaltaram que Getúlio Vargas cumprira promessa feita em comício de campanha, em Feira de Santana, no sentido de colaborar com a implantação da água encanada. Nessa mesma sessão, foram também elogiados o ministro Simões Filho e o deputado Carlos Valladares. Além dos elogios, os vereadores criaram comissão (formada pelo Prefeito Municipal, Presiden~ te do Conselho da Câmara, vereadores Francisco Pinto e Wilson Falcão, e Francisco Caribé - presidente da Associação Comercial) para ir à Capital Federal (Rio de Janeiro) agradecer a doação em nome do povo feirense.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Os fracassos dos planos municipais mais ambic~osos não -~esanimljIam o projeto de modernizar o abastecimento d' água de Feira de Santana. Nos dois últimos séculos, o Poder Público reparou e construiu fontes, poços, chafarizes e cataventos d' água (havia um desses cataventos na Praça Bernardino Bahia), tomou empréstimos, recebeu doações, realizou obras de saneamento básico, abertura de aguadas, concessões e desapropriações para fins de abastecimento, realizou obras diversas na Lagoa do Prato Raso, Fonte do VaIado, Tanque da Nação, Fonte do Mato, etc.



Através da água encanada (1952) e mais tarde com a industrialização (década de 70), Feira de Santana, passava a olhar para os horizontes do tal "progresso" que dava às costas definitivamente para os rios, nascentes e lagoct-s, destinando-Ihes mais de meio século de promessas não cumpridas, abandono e degradação'ambiental. Uma visível ingratidão com esses aqüíferos cuja perenidade (maior ou menor em meio a severas e constantes estiagens) tomou possível a civilização feirense. lnjustificadamente, o advento da água encanada marcou o início do esquecimento e do abandono definitivo das lagoas, rios e nascentes por parte dos poderes públicos, municipais, estaduais e federais. Fascinada pela comodidade políticaJopedlcional/sanitária da água encanada, Feira de Santana não tinha mais olhos, estava cega, para os mananciais que, ao lado da feira livre, até então justificavam os títulos de Princesa do Sertão e Feira de Santana dos Olhos d' Água.



Em meio a inúmeros exemplos de lagoas que - desprezadas pelos poderes públicos - foram aterradas, cegamente, peIas invasões dos pobres, pelos conjuntos residenciais e comerciais e pelas invasões dos ricos, destacamos apenas o caso da Lagoa Grande. Em 7 de novembro de 1986, o jornal A Tarde, de Salvador, veiculou a seguinte notícia:


O Parque Lagoa Grande é outro projeto que o EPI executou e será viabilizado ainda este ano de 86, pois segundo Lodtone, o prefeito José Falcão da Silva quer entregar à comunidade o parque como mais uma alternativa de lazer. Esclareceu Lodtone que a Lagoa Grande sofrerá uma total limpeza e o projeto inclui bosques, área de camping, quiosques, quadras polivalentes, ginásio de esportes, postos periféricos, além de um estacionamento com grande capacidade para absorver o volume de veículos que levarão as pessoas até o parque.



Nada disso foi realizado. A Lagoa Grande, e também a do Prato Raso, eram visíveis - na década de 80 - por todos quantos passassem pelas avenida do Contorno e (atual) José Falcão. Hoje encontram-se totalmente amesquinhadas, aterradas e ocupadas pela vegetação.


Em meados de 1991 - o ano que foi marcado pelo retormo, da cólera - ambientalistas, professores da Universidade Estadual de Feira de Santana que integravam a equipe do Projeto Nascentes, Lagoas e Rios de Feira de Santana e tantos outros levaram o acintoso aterro da Lagoa do Prato Raso à Justiça. , Prestaram depoimento à Curadoria do Meio Ambiente. Entretanto, a lagoa foi aterrada pelo lixo, pelos entulhos e pelos interesses vorazes e estranhos às necessidades ambientais e .socioeconôrnicas da maioria.


A década de 90, século XX, mais precisamente em 1991 e ,1993, começou com as agruras de mais um período de seca, vitimando gente, animais e plantações e elevando os preços de gêneros alimentícios. E, em muitos lugares encarecendo a própria água ainda vendida sobre as quatro patas dos burros, e sobre as quatro rodas dos caminhões-pipa. Como assevera o dito popular, "tudo como era dantes no "mísero povoado" .., quero dizer, "no quartel de Abrantes". As lagoas que antes matavam a sede de água e de banho de gente e animais, hoje servem de cJoaca para gado e gente. Os leitos das lagoas - a exemplo do que acontece nos bairros Lagoa Salgada e Novo Horizonte - vêm sendo escavados para a fabricação de tijolos pelas cerâmicas, muitas delas livre e escancaradamente construídas nas margens destes mananciais.
A aguaonia ocular e a cegueira de uma cidade sem olhos d'água e sem saúde. E sem memória.



REFERÊNCIAS


FEIRA DE SANTANA. Arquivo Municipal. AtÇls da Câmara, 8 de abril de 1886.

FEIRA DE SANTANA. Arquivo Municipal. Atas da Câmara, 5 de fevereiro de 1890.

FEIRA DE SANTANA. Arquivo Municipal. Atas da Câmara, 27 de março de 1890.

FEIRA DE SANTANA. Arquivo Municipal. Atas da Câmara, 10 de fevereiro de 1892.

FEIRA DE SANTANA. Arquivo M\lnicipal. Livros de Atas da Câmara, 1912, p. 0005 v)

FEIRA DE SANTANA. Câmara de Vereadores. Atas da Câmara, Feira de Santana, 1912, p. 0007.

FEIRA DE SANTANA. Arquivo Municipal. Livro de Requerimento e Despacho, 1915~1916, p. 23.

FOLHA DO NORTE, Feira de Santana, 5 de outde 1940-crôriicas da vidafeirense de 5 de outubro de 1923.

FOLHA DO NORTE, Feira de Santana, edição de 5 de março de 1938.

FOLHA DO NORTE, Feira de Santana, 17 de agosto de 1940.

MOREIRA, Vicente Deocleciano. Feira de Santana, 1819: sem águas de março. jornal Feira Hoje. Feira de Santana, 21 de março de 1993,p. 4.

O PROPULSOR, Feira de Santana, 13 de março de 1897.

O PROPULSOR, Feira de Santana, 29 de agosto de 1898.

O PROPULSOR, Feira de Santana, 12 de fevereiro de 1899.

O PROPULSOR, Feira de Santana, 12 de março de 1899 O PROPULSOR, Feira de Santana, 3 de dezembro de 1899 ..

O PROPULSOR. Feira de Santana, edições de 18 e 30 de julho de 1899 e de 25 de novembro de 1900.

O PROPULSOR, Feira de Santana, 28 de janeiro de 1900.

A TARDE, Salvador, 7 de novembro de 1986.

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