1 - O MORRO, A FAVELA (II)
Vicente Deocleciano Moreira
Talvez não haja tanto peso e tanta importância minerar a obra do carioca Chico Buarque no que ela retrata da relação favela (morro) e cidade ... isso para as pessoas que, por hábito, apatia, falta de tempo ou de (boa)vontade, não se debruçam sobre a patrimônio da Velha Guarda da MPB; é do feitio desses velhos/queridos compositores cantar e contar o morro, a favela ... notadamente do Rio de Janeiro (Brasil) como um locus distante e divorciado da cidade. Da cidade ... lá embaixo.
"Pivete", "Pelas Tabelas", "Estação Derradeira" e "Morro Dois Irmãos" (ver letras na postagem de ontem, terça-feira) são capazes de representar a estética buarqueana a serviço de uma compreensão sociológica (ou o inverso?) da favela, do morro ... e suas ligações orgânicas viscerais mesmo (!) com a cidade do Rio de Janeiro.
(Largo da Carioca - Rio de Janeiro - Brasil)
A expressão "Pivete" é hoje (2011) termo de bem pouco uso. Desusado mesmo. Arcaico. Talvez quem tenha hoje menos de 20 anos sequer saiba o que significa mas, há quase trinta anos, quando a letra foi escrita, significava ladrão de menor idade (menos de 18 anos de idade). O sujeito lírico de "Pivete" é um pivete morador da favela ( Morro do Borel, quem sabe [?]). Mas ele tem vida ativa na cidade ... se ainda insistimos na oposição morro X cidade que fez a delícia da Velha Guarda da MPB. Sinal de trânsito fechado, semáforo fechado (vermelho) ele entra em ação: 1) ora com uma flanela limpa vidros dos carros, ora vende gomas de mascar (chicletes) ... que são atividades ilegais pois, sendo criança, não lhe é permitido por lei trabalhar, e sim apenas estudar. Mas ...: 2) ora furta,outras vezes rouba e danifica automóveis ... atividades também ilícitas, criminosas.
(Morro do Borel)
Ilícitos, ilegalidades e atividades criminosas ... classificações e rotulagens à parte, o fato é que, Chico Buarque as utiliza para patrocinar, através do enfant terrible, o abraço físico (afetivo [?]), ecológico, sociológico e as trocas simbólicas entre moro e cidade. Entre o Morro do Borel, por exemplo, e o vizinho bairro da Tijuca (do qual faz parte) . .. a cidade enfim.
Na letra "Pelas Tabelas", a palavra FAVELA aparece oito vezes; e não é para fazer rimas fáceis na opus de um poeta que não faz rimas fáceis.
"Estação Derradeira" nos dá conta da incrível diversidade de papéis e atores nesse palco et pour cause dramático, chamado favela. morro; no caso, o Morro da Mangueira pai/mãe da Escola de Samba Mangeurira - a minha amada verde e rosa -, a preferida do coração dos nossos Chico Buarque ... Cartola, da nossa Beth Carvalho e de mais um supertime mangueirense de fazer inveja.
"Estação Derradeira" nos dá conta da incrível diversidade de papéis e atores nesse palco et pour cause dramático, chamado favela. morro; no caso, o Morro da Mangueira pai/mãe da Escola de Samba Mangeurira - a minha amada verde e rosa -, a preferida do coração dos nossos Chico Buarque ... Cartola, da nossa Beth Carvalho e de mais um supertime mangueirense de fazer inveja.
O AMOR URBANO de Chico pelo morro, pela favela, é tecido com a delicadeza de um artesão, de uma mulher rendeira nordestina ou uma bordadeira aplicada. Essa tessitura aparece nbem diversas letras, mas peço licença para pedir destaque ao lírismo - permitam-me - geológico de "Morro Dois Irmãos":
(Morro Dois Irmãos, "montanha em movimento")
Dois Irmãos, quando vai alta a madrugada
E a teus pés vão-se encostar os intrumentos
Aprendi a respeitar tua prumada
E desconfiar do teu silêncio
Penso ouvir a pulsação atravessada
Do que foi e o que será noutra existência
É assim como se a rocha dilatada
Fosse uma concentração de tempos
É assim como se o ritmo do nada
Fosse, sim, todos os ritmos por dentro
Ou, então, como um música parada
Sobre uma montanha em movimento
Dizer mais o quê ... senão ATÉ AMANHÃ ... com mais Chico Buarque de Hollanda
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