sábado, 30 de outubro de 2010

VIVALDO E O MACIEL (3) - Vicente D. Moreira

VIVALDO E O MACIEL (3)

Vicente D. Moreira

(continuação)


Para quem não sabe, não sabia, jamais soube e para quem já sabe, o Maciel (Maciel de Baixo e Maciel de Cima) localizava-se no Pelourinho e se diferenciava do Carmo, Santo Antonio Além do Carmo ... (também localizados no Pelourinho) porque muitos de seus casarões e ruas abrigavam a prostituição e seus "atores" coadjuvantes - o que lhe configurava uma ambiência típica, incomparável. Era considerado um lugar "perigoso", "zona" de prostituição, supsoto esconderijo de desocupados e de criminosos perseguidos pela Polícia.

As Ruas João Deus (Maciel de Cima) e Gregório de Mattos (Maciel de Baixo), Inácio Acciolly (Beco do Mijo e Boca do Lixo), Francisco Munioz Barreto (Laranjeiras), Santa Izabel, J. Castro Rebelo, Frei Vicente (Açouguinho) e Leovigildo de Carvalho (Beco do Mota)eram eram oMaciel e quem nelas residia ou trabalhava "pagava" caro pelo estigma de morar ou trabalhar no "brega".


Era um trabalho para conter os marinheiros. Quando chegavam, queriam entrar em casa de família, era uma confusão, tinha que colocar um letreiro: "Casa de Família" (Maciel, 1930, depoimento de um policial que, na época, ali trabalhava)

Tinha muitos suicídios, muitas mulheres fracassavam, pegavam moléstias, se jogavam da janela, às vezes era porque estavam com uma moléstia ruim, ou por paixão ou abandono do amante. (depoimento de morador antigo do Maciel)


Depois que a Fundação do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia interveio noMaciel, o número de prostitutas diminuiu de modo significativo. A Fundação passou a ser, independente de seu planejamento e vontade de seus técnicos, um agente de mudança na tessitura urbana do Pelourinho e do Maciel.


Para se ter uma idéia mais nítida da decadência dea atividade de prostituta no Maciel, basta citar, de posse de dados atuais que, de 449 prostitutas existentes na área em 1969, em 1976 apenas residiam 171 prostitutas. Em 1978, 109 e, noano de 1980 (quando do último censo realizado pelo IPAC na área) apenas 75 prostitutas trabalhavam. (MAURICIO, 1981 : 10-11)


Mesmo assim, indiferente a este decréscimo, o estigma de "meretrício", de "boca quente" continuava marcando o Maciel aos olhos da população de Salvador. Mas a queda quantitativa não atingiu apenas as prostitutas. Também o perfil da oferta de imóveis foi reduzido em alguns casos (em outros, se expandiu), com o passar do tempo. Menezes (1980 : 35-36) compara esta oferta no início dos trabalhos da Fundação no Maciel, 1969, e dez anos depois. Em 1969:

imóveis com uso individual --------- 153 - 69,0%
imóveis com uso comercial ---------- 38 - 17%
imóveis arruinados ue terrenos
baldios ---------------------------- 23 - 10%
imóveis fechados e/ou em obras ----- 9 - 4%

Em 1980:

imóveis com uso residencial -------- 101 - 46%
imóveis com uso comercial ---------- 26 - 11,0%
imóveis arruinados ------------------ 53 - 24,0%
imóveis fechados e/ou em obras ------ 27 - 12,0%
imóveis ocupados com instituições --- 16 - 7%


Ao longo de dez anos, cresceu a quantidade de imóveis fechados e/ou em obras e de prédios arruinados. Aparece a condição de imóveis ocupados com instituições, num claro sinal de que ao menos alguns setores passaram a acreditar no trabalho da FPAC no Pelourinho, n o Maciel, a exemplo do Complexo do SENAC(*)(restaurantes, teatro, pequeno museu, galeria de arte, etc.), inaugurado em 1975, no Largo do Pelourinho, área sob franca influência do Maciel.

Hoje, as ruas continuam com o mesmo nome oficial; desapareceram porém as placas que indicavam os prédios que ofereciam serviços da Fundação: Posto Médico, Centro de Atenção Social, Coordenações, etc. Sumiram, da memória popular, personagens como Sergipinho, Joaquim do bar "O Tempo" (que viveu seus últimos dias no Largo do Pelourinho) e expressões como Maciel de Baixo, Maciel de Cima, Beco do Mijo, Beco do Lixo, Laranjeiras, Açouguinho e Beco do Mota. O próprio Maciel desapareceu; não mais existe; dele não mais se ouve falar nem bem nem mal; sobre ele já não mais se escreve; a imprensas não tem masis o que fotografar e filmar, ao vivo. O Maciel sobrevive, porém, na lembrança dos que o conheceram, nele morararm ou trabalharam, continua pulsando nas obras de Jorge Amado, dos artistas, dos textos teatrais e dos técnicos do FPAC/IPAC que o fotografaram, pensaram, grafarram, desenharam, e namemória de todos eles. Hoje existe apenas o Pelô, o Pelourinho.


(amanhã, domingo, mais Maciel)
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(*) Nota do Blog
SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem Comerical, entidade promotora de cursos (artesanato, garçonaria e hotelaria, cabeleireiro ...) mantida por comerciantes e empresários baianos em geral.

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