terça-feira, 26 de outubro de 2010

LENDO "NÃO-LUGARES" DE MARC AUGÉ (5)

strong>strong>LENDO "NÃO-LUGARES" DE MARC AUGÉ (5)



AUGÉ, Marc. Não-Lugares: Introdução a uma antropologia da
supermodernidade. São Paulo: Papirus, 1994, 111 páginas.


João Luis Binde
Resenha

Fonte : ANTROPOS – Revista de Antropologia – Volume 2, Ano 1, Maio de 2008 – ISSN 1982-1050


Augé afasta-se do termo pós-modernidade preferindo utilizar a palavra supermodernidade para dar a idéia de continuidade. Na modernidade atual observamos mais fatores de aceleração, como do tempo, do que de ruptura. Em suas palavras: “quanto ao termo pós-modernidade, muitos o empregam, inclusive alguns antropólogos norte-americanos, para dar a idéia de pós como coisa completamente diferente. Mas não podemos entender o que acontece hoje sem fazer referência ao século XVIII. 0, e me parece perigoso pensar apenas a partir do respeito à diversidade. A diversidade, em princípio, é uma coisa boa, mas não
sistematicamente. É preciso pensar a cultura, a diversidade, a identidade,
sempre em movimento, nunca de maneira fixa.” (Entrevista dada ao jornal
argentino Página/12, 11-04-2007).

A antropologia passa por uma brusca mudança. Seu objeto, outrora “distante”, exótico, agora converge para o que Auge chama de antropologia do próximo. O que se coloca em debate em “Não-Lugares: Introdução a uma Antropologia da Supermodernidade” é o próprio status da antropologia na contemporaneidade, qual o grau de apreensão das sociedades complexas pelo método antropológico? Neste sentido, propõe uma nova postura no que concerne a reflexão sobre a contemporaneidade diante do deslocar da discussão do método para o objeto.

No livro em questão, Augé define os chamados não-lugares como um espaço de passagem incapaz de dar forma a qualquer tipo de identidade. Na busca de fundamentar sua assertiva, discute a capacidade efetiva da antropologia analisar e compreender a sociedade de hoje, mcaracterizada por ele como supermodernidade. As principais características desse novo tipo de organização social são por ele destacadas:

a) um novo entendimento da categoria de tempo. O ideal de progresso humano é frustrado diante de guerras, genocídios, intolerância, violência. Somado a isto, a categoria tempo, devido ao mundo hight tec, é acelerado. Hoje, o ontem já é História, tudo se torna acontecimento e que, por haver tantos fatos, já nada é acontecimento. Um mesmo objeto é passível de múltiplas análises. Isso se dá pela constante busca do ser humano de dar sentido ao mundo. “Essa necessidade de dar um sentido ao presente, senão ao passado, é o resgate da superabundância factual que corresponde a uma situação que poderíamos dizer de supermodernidade para dar conta de sua modalidade essencial: o excesso” (p.32). Logo, organizar o mundo a partir da
categoria tempo já não mais faz sentido;

b) as constantes transformações espaciais, a mobilidade social, a troca de bens e serviços e o enorme fluxo de informação dão impressão de que o mundo encolheu. Este encolhimento provoca alteração da escala em termos planetários através da concentração urbana, migrações populacionais e produção de não-lugares – aeroportos, vias expressas, salas de espera, centros comerciais, estações de metrô, campos de refugiados, supermercados, etc., por onde circulam pessoas e bens. Hoje, estamos inseridos em todos os lugares, mesmo nos lugares mais longínquos;

c) estes fatores enfraquecem as referências coletivas, gerando um individualismo exacerbado, porém sem identidade. Portanto, o chamado não-lugar caracteriza-se por não ser relacional, identitário e histórico. Como exemplo de não-lugares, podemos
citar as auto-estradas, os aeroportos e os supermercados. Há também aqueles lugares outrora promotores do mundo operário, hoje vistos como espaço para aqueles que não possuem emprego, pessoas sem abrigo por motivos diversos.

São não-lugares por acolher, mesmo que provisoriamente, homens e mulheres que pela intolerância de nossa ordem social, viram-se constrangidos à expatriação urbana.

Outra característica destacada pelo autor dos não-lugares é que estes são permeados de pessoas em trânsito. São espaços de ninguém, não geradores de identidade. Lá, você ou eu, não importa, somos apenas mais um.

Em oposição aos não-lugares está o espaço antropológico, necessariamente criador de identidade, fomentador de relações interpessoais; move-se num tempo e no espaço estritamente definidos, “[…] é simultaneamente princípio de sentido para aqueles que o habitam e princípio de inteligibilidade para quem o observa” (p. 51). São identitários, relacionais e históricos.

É criador de identidade por trazer em si o lugar do nascimento, da intimidade do lar, das coisas que são nossas. Demarca, de forma precisa, as fronteiras entre eu e os outros. É histórico porque fala da história nativa sem considerar a história como ciência.

Em oposição, os não-lugares não se definem como identitários, relacionais ou históricos. Através dos não-lugares se descortina um mundo provisório e efêmero, comprometido com o transitório e com a solidão. Os não-lugares são uma nova configuração social, característica de uma época que se define pelo excesso de fatos, superabundância espacial e individualização das referências. Nesse sentido, de acordo com o autor, apresenta-se ao antropólogo um novo objeto, ou seja, a contemporaneidade a ser estudada nas suas contradições e complexidades. Pensar a cidade não é insistir em apropriar-se ou em querer pertencer a um bairro, mas estudar os recursos urbanísticos, os equipamentos e serviços que permitem ao citadino superar o estranhamento de um território pouco familiar e orientar-se em um universo de estranhos.

O livro é indicado a todos aqueles que procuram entender melhor o mundo à sua volta, mas especificamente para os antropólogos urbanos que visam lançar um novo olhar para a cidade; para pastores e líderes evangélicos tal leitura é indicada pela sua fácil compreensão, além de proporcionar novos conhecimentos da realidade que nos cerca para uma prática pastoral contextual e relevante.
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AUGÉ, Marc. Não-Lugares: Introdução a uma antropologia da
supermodernidade. São Paulo: Papirus, 1994, 111 páginas.


João Luis Binde
Resenha

Fonte : ANTROPOS – Revista de Antropologia – Volume 2, Ano 1, Maio de 2008 – ISSN 1982-1050


Augé afasta-se do termo pós-modernidade preferindo utilizar a palavra supermodernidade para dar a idéia de continuidade. Na modernidade atual observamos mais fatores de aceleração, como do tempo, do que de ruptura. Em suas palavras: “quanto ao termo pós-modernidade, muitos o empregam, inclusive alguns antropólogos norte-americanos, para dar a idéia de pós como coisa completamente diferente. Mas não podemos entender o que acontece hoje sem fazer referência ao século XVIII. 0, e me parece perigoso pensar apenas a partir do respeito à diversidade. A diversidade, em princípio, é uma coisa boa, mas não
sistematicamente. É preciso pensar a cultura, a diversidade, a identidade,
sempre em movimento, nunca de maneira fixa.” (Entrevista dada ao jornal
argentino Página/12, 11-04-2007).

A antropologia passa por uma brusca mudança. Seu objeto, outrora “distante”, exótico, agora converge para o que Auge chama de antropologia do próximo. O que se coloca em debate em “Não-Lugares: Introdução a uma Antropologia da Supermodernidade” é o próprio status da antropologia na contemporaneidade, qual o grau de apreensão das sociedades complexas pelo método antropológico? Neste sentido, propõe uma nova postura no que concerne a reflexão sobre a contemporaneidade diante do deslocar da discussão do método para o objeto.

No livro em questão, Augé define os chamados não-lugares como um espaço de passagem incapaz de dar forma a qualquer tipo de identidade. Na busca de fundamentar sua assertiva, discute a capacidade efetiva da antropologia analisar e compreender a sociedade de hoje, mcaracterizada por ele como supermodernidade. As principais características desse novo tipo de organização social são por ele destacadas:

a) um novo entendimento da categoria de tempo. O ideal de progresso humano é frustrado diante de guerras, genocídios, intolerância, violência. Somado a isto, a categoria tempo, devido ao mundo hight tec, é acelerado. Hoje, o ontem já é História, tudo se torna acontecimento e que, por haver tantos fatos, já nada é acontecimento. Um mesmo objeto é passível de múltiplas análises. Isso se dá pela constante busca do ser humano de dar sentido ao mundo. “Essa necessidade de dar um sentido ao presente, senão ao passado, é o resgate da superabundância factual que corresponde a uma situação que poderíamos dizer de supermodernidade para dar conta de sua modalidade essencial: o excesso” (p.32). Logo, organizar o mundo a partir da
categoria tempo já não mais faz sentido;

b) as constantes transformações espaciais, a mobilidade social, a troca de bens e serviços e o enorme fluxo de informação dão impressão de que o mundo encolheu. Este encolhimento provoca alteração da escala em termos planetários através da concentração urbana, migrações populacionais e produção de não-lugares – aeroportos, vias expressas, salas de espera, centros comerciais, estações de metrô, campos de refugiados, supermercados, etc., por onde circulam pessoas e bens. Hoje, estamos inseridos em todos os lugares, mesmo nos lugares mais longínquos;

c) estes fatores enfraquecem as referências coletivas, gerando um individualismo exacerbado, porém sem identidade. Portanto, o chamado não-lugar caracteriza-se por não ser relacional, identitário e histórico. Como exemplo de não-lugares, podemos
citar as auto-estradas, os aeroportos e os supermercados. Há também aqueles lugares outrora promotores do mundo operário, hoje vistos como espaço para aqueles que não possuem emprego, pessoas sem abrigo por motivos diversos.

São não-lugares por acolher, mesmo que provisoriamente, homens e mulheres que pela intolerância de nossa ordem social, viram-se constrangidos à expatriação urbana.

Outra característica destacada pelo autor dos não-lugares é que estes são permeados de pessoas em trânsito. São espaços de ninguém, não geradores de identidade. Lá, você ou eu, não importa, somos apenas mais um.

Em oposição aos não-lugares está o espaço antropológico, necessariamente criador de identidade, fomentador de relações interpessoais; move-se num tempo e no espaço estritamente definidos, “[…] é simultaneamente princípio de sentido para aqueles que o habitam e princípio de inteligibilidade para quem o observa” (p. 51). São identitários, relacionais e históricos.

É criador de identidade por trazer em si o lugar do nascimento, da intimidade do lar, das coisas que são nossas. Demarca, de forma precisa, as fronteiras entre eu e os outros. É histórico porque fala da história nativa sem considerar a história como ciência.

Em oposição, os não-lugares não se definem como identitários, relacionais ou históricos. Através dos não-lugares se descortina um mundo provisório e efêmero, comprometido com o transitório e com a solidão. Os não-lugares são uma nova configuração social, característica de uma época que se define pelo excesso de fatos, superabundância espacial e individualização das referências. Nesse sentido, de acordo com o autor, apresenta-se ao antropólogo um novo objeto, ou seja, a contemporaneidade a ser estudada nas suas contradições e complexidades. Pensar a cidade não é insistir em apropriar-se ou em querer pertencer a um bairro, mas estudar os recursos urbanísticos, os equipamentos e serviços que permitem ao citadino superar o estranhamento de um território pouco familiar e orientar-se em um universo de estranhos.

O livro é indicado a todos aqueles que procuram entender melhor o mundo à sua volta, mas especificamente para os antropólogos urbanos que visam lançar um novo olhar para a cidade; para pastores e líderes evangélicos tal leitura é indicada pela sua fácil compreensão, além de proporcionar novos conhecimentos da realidade que nos cerca para uma prática pastoral contextual e relevante.

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