quinta-feira, 9 de setembro de 2010

FEIRA DE SANTANA NO TEMPO DO CÓLERA (2 - FINAL)

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Vicente Deocleciano Moreira

(continuação)

Na verdade, não havia e nem há relação de causa e efeito entre os miasmas (nome generalizado dos gases liberados pela matéria em decomposição) com a incidência do Cólera, Nem todas as pessoas, em contato comn esses gases, contraem a moléstia; por outro lado, inúmeras outras ficam acometidas da enfermidade, convivendo em ambientes secos, limpos e arejados. Uma outra compreensão m´´edica da época denunciava a presença de um supodto veneno nas lagoias, fontes e poços de que se serviam os feirenses. Essas duas compreensões foram superadas pela descoberta do vibrião colérico por John Snow na segunda metade do século XIX.

O vibrião é um gênero de bactéria que apresenta a forma de bastonete recurvo, móvel, com dois ou três cílios polares. Lagoas, rios, nascentes, poços, aguadas ... eram as fontes de abstrecimento (bebida, higiene, irrgação e lavagem de alimentos) e, ao mesmo tempo, de esgotamento sanitário da Feira de Santana do século XIX. Era exatamente nesses mananciais que se desenvolvia o habitat do vibrião colérico. Não seria exagerado dizer que dezenas de famílias, nesta primeira década do século XXI, continuam fazendo esse duplo uso dos manaciais de Feira de Santana com o agravante de que eles, hoje, também recebem dejetos industriais.

A pobreza, a miséria e as precárias condições condições sanitárias delas decorrentes, que caracterizavam a maior parte dos moradores de Feira de Santana no século XIX (e neste), já anteviam facilmente o quadro socioeconômico futuro da região. O tipo de solo favorecia a infiltração e, também, a drenagem de fezes de portadores do Cólera para os rios e lagoas cujas águas, como foi ditro anteriormente, eram consumidas pela população em geral.

"O cólera se encarniçou muito mais contra a a população negra por ser mais numerosa, mas na realidade não teve contemplações com cores nem linhagens" (GARCIA MARQUEZ, p. 141)

Na primeira semana de dezembro de 1855, a epidemia apresentava sinais de declínio, ao mwenos na sede de Feira de Santana.

"Parou de chofre como havia começado, e nunca se souibe o número de suas vítimas, não porque não fosse possível estabelecê-lo, e sim porque uma de nossas virtudes corriqueira era o pudor das desgraças". (GARCIA MARQUEZ, p. 141)

Na segunda quinzena, porém, o Cólera reapareceu com violência principalmente em Limoeiro e Bonfim, causando morte e desesperoi.

"Parecia mesmo que a epidemia sofrera uma nova animação de suas forças, como se a tenacidade e a fertilidade de seus bacilos se tivessem dobrado" (MANN, p. 160)

As manifestações da doença nas pessoas e os sepultamentos diários das vítimas obrigaram que muitos moradores se mudassem, ainda que provisoriamente, para Salvador e ourtras cidades vizinhas. Os mais ricos refugiavam-se nas fazendas, a exemplo do conhecido negociante José Marques de Oliveira Lima, fundador do Arraial das Almas - nome da propriedade. Feira de Santana transformava-se, então, numa "cidade fantasma".

Em fins de 1855, o Cólera fez um número tão expressivo de enfermos e vítimas fatais que se tornou inadiável a construção de um hospital e, notadamente, um cemitério. Não era aconselhável sobretudo do ponto de vista higiênico-sanitário, continuar sepultando no adro da Matriz de Santana, mesmo que os cadáveres fossem de vítimas ricas e socialmenmte prestigiadas.



(Igreja Matriz de Nossa Senhora Santana - Feira de Santana)


em>"Até então, alguns mortos insígnes eram sepultados debaixo das lages das igrejas, na vizinhança esquiva dos arcebispos e dignatários, e os menos ricos eram enterrados nos pátios dos conventos. Os pobres iam para o cemitério colonial, numa colina ventosa separada da cidade por um canal de águas áridas." (GARCIA MARQUEZ, p. 140)

Geralmente, os mais pobres e os menos reconhecidos eram sepultados em covas rasas num terreno atrás da Matriz. Como as escavações necessárias à implantação da ferrovia eram feitas nesse local, corpos inteiros, membros, etc, em franco estado de decomposição eram entregues à ação dos animais.


O pânico geral era alimentado pela repetição do seguinte acontecimento: muitos coléricos repentinamente desmaiavam (às vezes em plena rua) e como continuavam
a não apresentar sinais de vida, eram dados como mortos e conduzidos ao sepultamento. Inesperadamente, recuperavam os sentidos, provocando amedrontada correria. Um caso antológico: no período mais agudo da epidemia, conduziram ao adro da Matriz uma mulher de nome Maria, tida como morta. A fila de sepultamentos estava, como sempre, comprida e o "cadáver" de Maria teve que esperar até a noie para ser enterrado. À noite, Maria despertou, abriu a tampa do caixão e dirigiu-se ao centro da cidade, ficando conhecida como "Maria Epidemia".

"Feliz daquele cuja erupção se dava em forma de um profundo desmaio, como às vezes acontecia, depois de um leve mal-estar, do qual não acordava mais ou quase não acordava." (MANN, p.160)

O ano de 1856 chegou sem muitas promessas de solução contra a epidemia. Os casos aumentavam e os profissionais e voluntários de saúde não conseguiam proporcionar atendimento satisfatório, principalmente aos pacientes pobres (grande maioria dos coléricos). Em fins de janeiro de 1856, o governo da província da Bahia enviou um novo médico a Feira de Santana na tentativa de equacionar a crise adicional gerada pelo falecimento do cirurgião José Caetano Alvim em novembro de 1855. Meses depois, a epidemia passou a dar sinais de recuo, tranquilizando a população feirense.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA FILHO, Naomar de. Epidemiologia sem NúmerosUma introdução. Rio de Janeiro, Campus, 1989, 108p.

GARCIA MARQUEZ, Gabriel. O Amor no Tempo do Cólera. Tradução por Antonio Callado. Rio de Janeiro, Record, 1985, 429p.

MANN, Thomas. A Morte em Veneza. São Paulo, Abril, 1971, p. 89-172. (Os imortais da literatura universal, fascículo 17).

POPPINO, Rollie E. Feira de Santana. Salvador, Itapuã, 1968, 328p.

SNOW, John. Sobre a Maneira de Transmissão do Cólera.2ª ed. rev. por John Churchill. Rio de Janeiro, USAID, 1967, 188p.

HEMEROGRAFIA

JORNAL FOLHA DO NORTE. Feira de Santana, Bahia, Ediçõies de 1923 a 1952.










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