quarta-feira, 5 de maio de 2010

TOQUE DE RECOLHER EM FEIRA DE SANTANA - DESDOBRAMENTOS E PARECER (3 - FINAL)

TOQUE DE RECOLHER EM FEIRA DE SANTANA - DESDOBRAMENTOS E PARECER (3 - FINAL)
CONANDA SE POSICIONA CONTRA TOQUE DE RECOLHER
PARECER DO PROF. FELIPE FREITAS /CEJUVE - BA






8) A polícia não deve ser empregada em ações visando o recolhimento de
crianças e adolescentes. Nesse sentido, o Estatuto e a normativa construída
nos últimos 19 anos prevêem a necessidade de programas de acolhimento
com educadores sociais que façam a abordagem de crianças e adolescentes
que se encontrem em situação de rua e/ou de risco. Muitas vezes, os abusos
sofridos nas próprias casas geram a ida de crianças e adolescentes para as
ruas. Nesses casos, a solução também não é o toque de recolher. O adequado
é a atuação dos órgãos e programas de proteção, acolhimento e atendimento
às crianças, aos adolescentes e às famílias. Devemos destacar que, diante de
situações de risco em que se encontrem crianças e adolescentes, qualquer
pessoa da sociedade pode e deve acionar os programas de proteção e/ou os
Conselhos Tutelares, assim como todos da sociedade têm o dever de agir,
conforme suas possibilidades, visando prevenir ou erradicar as denominadas
situações de risco;

9) O procedimento do Toque de Recolher contraria o direito à convivência
familiar e comunitária, restringindo direitos também de adolescentes que,
por exemplo, estudam à noite, frequentam clubes, cursos, casas de amigos e
festas comunitárias;

10) Conforme os motivos acima elencados, o Toque de Recolher contraria o
ECA e a Constituição Federal. É uma medida paliativa e ilusória, que
objetiva esconder os problemas no lugar de resolvê-los. As medidas e
programas de acolhimento, atendimento e proteção integral estão previstas
no ECA, sendo necessário que o Poder Executivo implemente os programas;
que o Judiciário obrigue a implantação e monitore a execução e que o
Legislativo garanta orçamentos e fiscalize a gestão, em inteiro cumprimento
às competências e atribuições inerentes aos citados Poderes.

Nesses termos, o Conanda recomenda:

1) Que todos os municípios tenham programas com educadores sociais que possam fazer a abordagem de crianças e adolescentes que se encontrem em situações de risco, em
qualquer horário do dia ou da noite, visando os encaminhamentos e atendimentos especializados previstos na Lei;

2) Que todos os Municípios, Estados e União fortaleçam as redes de proteção social e o Sistema de Garantia de Direitos, incluindo Conselhos Municipais da Criança e do
Adolescente, Conselhos Tutelares, Varas da Infância e Juventude, promotorias e delegacias especializadas;

3) Que o Conselho Nacional de Justiça inclua em sua pauta de discussões o Toque de Recolher, objetivando orientar as Varas da Infância e Juventude sobre a ilegalidade e
inconstitucionalidade do procedimento.


Brasília, 18 de junho de 2009
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente


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PARECER

Assunto: Projeto de Lei nº 26/2010 que dispõe sobre Toque de Acolher crianças e adolescentes nas vias públicas do município de Feira de Santana – Estado da Bahia e dá outras providências

Autor: Ver. Luiz Augusto de Jesus (DEM – BA)

Parecerista: Felipe da Silva Freitas (CEJUVE – BA)

EMENTA: INCONSTITUCIONALIDADE DO TOQUE DE ACOLHER. LESÃO AO DIREITO DE LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO. DESCUMPRIMENTO DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. INTERFERÊNCIA NA FAMÍLIA. MEDO SOCIAL. ARQUIVAMENTO DO PROJETO.

A proposição que passo a relatar foi apresentada pelo Autor à Mesa Diretora da Câmara de Vereadores desta cidade em 15/03/2009 e dispõe sobre o Toque de Acolher crianças e adolescentes nas vias públicas do município de Feira de Santana instituindo que entre 20h30 as 05h da manhã para menores de 12 (doze) anos, entre 23h as 05h para menores de 17 (dezessete) e maiores de 12 (doze) anos fica proibida permanência em bares, ou pontos de venda de bebidas alcoólicas e em locais públicos desacompanhadas de seus pais e/ou responsáveis.
Prevê ainda que as crianças que se encontrarem nos locais descritos e expostos em situação de risco “serão encaminhados ao Conselho Tutelar, por medida de proteção, pelos Comissários do Juizado de Infância e Juventude, atuando a polícia no apoio à fiscalização juntamente com o Conselho Tutelar e a Secretaria de Prevenção e Combate a Violência ou outros órgãos que venham a ser determinados pelo Prefeito Municipal” (art. 5º do PL 26/2010)

Como exceção à Lei, prevêem-se os eventos micaretescos e juninos e, a título de sanção, institui a possibilidade de advertência dos pais e/ou responsáveis do menor em hipótese de infração ao Toque de Acolher e em caso de reincidência multa de 01 (um) a 10 (dez) salários mínimos.

É o relatório

(...) (...) (...)

Deste modo, a medida do toque de acolher resulta em atentado a este direito de convivência comunitária, restringe a possibilidade de interação das crianças e adolescentes com os seus companheiros de mesma idade e, dissemina, em toda sociedade, um sentimento de terror no espaço público provocado pelo discurso repressivo divulgado a partir do que se afirma no texto do PL n.º 26/2010.
Por outro lado, frise-se ainda o aspecto negativo do PL no sentido de retirar da família a referência na educação, proteção e guarda das crianças e adolescentes, posto que a interferência estatal resultará em agressão aos laços intergeracionais e enfraqueça relações de solidariedade e reciprocidade, apelando ao instrumento da força como meio de intervir em complexas relações sociais.
Assim, temos que o toque de recolher resultará em mais violência contra os negros e pobres, vítimas do racismo e da discriminação, que serão potencialmente indicados como perigosos e expostos ao discurso da situação de risco, através das lamentáveis políticas de recolhimento que, como ressalta o CONANDA lembram as tristes carrocinhas de menores.
Com o argumento de que estão “protegendo” os adolescentes os agentes responsáveis pela aplicação das medidas protetivas e socioeducativas em relação a crianças e adolescentes estão deste modo legitimados para, sob o argumento da lei, “endurecer” na modalidade punitivo, contra os grupos que, como já dissemos, compõem as vítimas preferenciaias do sistema de represenção do controle social formal do Estado.
Em verdade, essa iniciativa busca completar o vício escravista de setores da sociedade brasileira que apenas apreenderá meninos pretos e pobres expondo-os através dessas medidas a um perverso e infindável ciclo de violações que terá como grande propósito estigmatizá-lo e expô-los à criminalização.

Assim, por tudo o quanto exposto, entendemos que O PL 26/2010 que dispõe sobre toque de acolher crianças e adolescentes nas vias públicas do município de Feira de Santana – estado da Bahia e dá outras providências é inconstitucional quanto a matéria, visto que conflita com o art. 5º, inciso XV e art. 207 da Carta da República, atentando contra a liberdade de locomoção de crianças e adolescentes, bem como colide com os princípios constitucionais da proteção integral, da condição de pessoa em condição de desenvolvimento e da prioridade atendimento de crianças e adolescentes, pelo que se recomenda o arquivamento do projeto por inconstitucionalidade.

É o parecer,
S.M.J.

Feira de Santana – BA, abril de 2010.

Felipe da Silva Freitas

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