segunda-feira, 25 de abril de 2011

GAETA - A CIDADE DE BAUDELAIRE E HUGO (3 - FINAL)

 GAETA - A CIDADE DE BAUDELAIRE E HUGO (3 - FINAL)

Daí, possivelmente, a grande afinidade de Benjamin com Baudelaire e menor com Hugo, embora este último também tenha vivido (1802-1885) no período eleito por Benjamin: o Segundo Império de Napoleão III e Haussmann (1852-1870). É justamente ao redor do período que aparecem as suas duas obras mais consagradas: Notre-Dame de Paris (1831) e Os Miseráveis (1862).

Em Victor Hugo a crítica da modernidade é pessimismo em relação à expressividade da cidade moderna. Partindo do princípio que a cada época corresponde um modo de pensar e a cada modo uma maneira de expressão, Hugo identifica apenas a palavra escrita, o livro, como capaz de dar vazão ao tempo contemporâneo.

Mas, mesmo que Victor Hugo não encontre expressividade na cidade moderna, como em Benjamin, há aproximações entre os autores. 

A primeira proximidade envolve a questão da centralidade. Para Hugo a cidade é centro. É o lugar onde nasce e se distribui a idéia. Como desdobramento, o autor condensa o princípio na forma: “urbs resume orbis”. Trata-se de uma aproximação entre o círculo e a cidade delimitada. A valorização da cidade é a valorização do centro. O ideal de cidade medieval é o sinônimo da ausência do subúrbio. O seu centro é a cidade e a sedimentação de camadas históricas de usos e gostos. Essa cidade – centro é palco da diversidade de tempos e modos.

A centralidade é também um dos pontos importantes no retrato da cidade em Benjamin, porém com outras características. Trata-se da identificação, do reconhecimento, da procura de lugares em que se concentram as pessoas em suas buscas, em suas aventuras. Em Victor Hugo a centralidade está concentrada na catedral. Em Benjamin ela surge em diversas outras construções modernas como as galerias ou os passeios dos bulevares.

Outro aspecto de aproximação entre os autores, embora de modo diverso envolve a sacralidade. Em Victor Hugo essa centralidade é revestida de sacralidade:

A sacralidade em Benjamin reveste-se de ares profanos. Tal como Aragon, ele busca os lugares de confraternização, dos “novos cultos”, incluindo-se especialmente o do efêmero que caracteriza a modernidade. A citação de Aragon é reveladora: 

“Hoje não se adoram mais deuses sobre as alturas. O templo de Salomão passou, nas metáforas em que ele abriga ninhos de andorinhas e lívidos lagartos. O espírito dos cultos, dispersando-se na poeira, fez desertos os lugares sagrados. Mas há outros lugares que florescem entre os homens, outros lugares em que os homens se ocupam descuidadamente de sua vida misteriosa, e que pouco a pouco nascem para uma religião profunda. A divindade ainda não os habita. Ela se forma neles, é uma divindade nova que se precipita nessas modernas Éfesos, como no fundo de um vidro o metal deslocado por um ácido; é a vida que faz aparecer aqui essa divindade poética ,ao lado da qual tanta gente passará sem nada ver e que, repentinamente, torna-se sensível e terrivelmente obsedante para aqueles que a tenham percebido, desajeitadamente uma vez.” (ARAGON, 1996, p. 43)

Considerações Finais

Ao procurar a compreensão da modernidade, Benjamin valoriza como componente importante a urbanidade. As escolhas de retratos urbanos de Paris são feitas por Benjamin tendo em vista algumas de suas particularidades metodológicas: privilégio ao conflito, às tensões latentes; privilégio ao fragmento, à destruição, como questões particularmente desnudadas na modernidade; negação da razão sobreposta a todas as dimensões humanas e, portanto, recuperação do “homem integral” (da emoção, da interioridade) particularmente legível através da expressão artística.

Na escolha do retrato de Paris, Benjamin não se vale dos retratos dos “cientistas”, dos historiadores, e sim dos literatos, em especial dos poetas. A arte, reveladora e mais próxima do íntimo do ser, teria sua melhor expressão escrita na poesia. Benjamin vale-se da poesia também por sua capacidade condensadora, sintética, e esteticamente ao mesmo tempo aproximada do fragmento e da iluminação.

Na seleção que faz das obras de Victor Hugo, Benjamin não destacou Notre-Dame de Paris, o melhor retrato hugoniano da cidade - luz, tendo em vista que se fala de outra época que não a escolhida (século XIX). Distancia-se dos discursos fechados, como os presentes na tese de Hugo sobre a cidade. 

Distancia-se da concepção de um romantismo saudosista, cujo ideário, na época de Benjamin, aproximava-se perigosamente do discurso nazista. Não compartilha do descarte de Hugo à “obra de pedra” em nome da escrita. Em oposição, Benjamin vê a possibilidade na catedral moderna. Hugo teria acreditado no fim das catedrais, no livro e talvez no discurso dentro da multidão vazia. Benjamin parece encontrar na modernidade a construção de novas catedrais, capazes de criar uma nova sacralidade, inerente ao homem (culto e reunião), muito além da luta política explícita (o próprio cotidiano).

Em oposição, Benjamin encontra em Baudelaire outro olhar sobre o passado. Benjamin fixa seu olhar não no passado que desapareceu, mas naquilo que do passado restou. Fascina-se por esse passado, por esse resíduo, ainda que despojado de sua aura, de seu glamour, como fruto da destruição causada pela modernidade.

Bibliografia de Referência

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