domingo, 27 de fevereiro de 2011

ZARATUSTRA: DA MONTANHA PARA A CIDADE (7 - FINAL)

ZARATUSTRA: DA MONTANHA PARA A CIDADE (7 - FINAL)


"Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender ...

O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo..."

(Alberto Caeiro/Fernando Pessoa)



"A vida mais doce é não pensar em nada"
(Nietzsche)

Vicente Deocleciano Moreira

Já sentindo saudades, estamos a encerrar a série ZARATUSTRA: DA MONTANHA PARA A CIDADE. Com mais provocações e indagações  que soluções - vale marcar. Disse e repito que não tenho apetite para fazer ilações entre o modelo de  cidade 'da época' de Nietzsche (1844-1900) e a cidade


visitada por Zaratustra. Daí que não me perderei  em informações biográficas muito menos aquelas que façam referências às cidades por onde o filósofo passou ou viveu. O fato de a cidade, a "vaca malhada" ou a "vaca colorida", ser dotada de portas não significa necessariamente ser/ter sido uma cidade medieval.
Não sei se Salvador /capital da Bahia - Brasil/ pode ter sido uma "cidade medieval" por ter sido limitada - no século XVI, pelo pensamento urbanístico "medieval" do século XVI -  ao Norte pelas Portas do Carmo (no atual 'Largo do Pelourinho') e ao Sul  pelas Portas de Santa Catarina (na atual 'Praça Castro Alves').
No momento em que Zaratustra, cadáver do equilibrista sobre os ombros, transpõe as portas da "vaca colorida", ou (como queiram) da cidade, (sem dizer palavra em meio a tantos insultos e ameaças) talvez as portas não tenham sido - na cabeça genial de Nietzsche - um signo, uma porta concreta ... e sim uma metáfora. Um símbolo? Tanto que eu posso dizer muito bem que, ano passado,  ao sair das portas de Curitiba, encontrei um velho amigo,  etc, etc.
Como estamos in considerações finais autorizo-me a ser repetitivo até mesmo para (re)dizer que há três ecologias na trajetória zaratustriana: a montanha habitada pela águia e pela serpente e por toda a simbologia que esses animais carregam; a trajetória riscada pela solidão ... e o advento do 'santo' só faz realçar a solidão de Zaratustra; e a cidade. Que, como toda a cidade de todo e qualquer tamanho tem algo qualificado como principal: praça ou rua, não importa. Não importa, também, se o adjetivo (principal) tem origem no(s) princípio(s) ou no(s) príncipe(s) - mesmo que lá nuna tenha sido pisado por um príncipe ou princesa. A  rua principal  ou a praça principal quase sempre  abriga os principais equipamentos: sede da prefeitura, templo religioso mais importante, árvores mais copadas ou mais bonitas, jardins mais cuiodados, mais floridos, etc.


(Nietzsche)

Por que a cidade resiste e reponde com má vontade à insitência do 'novo' (do Super-homem) trazido por Zaratustra? Em meio a mil  possibilidades interpretativas e leituras,  de que representações  seriam representantes o equilibrista de um lado, e o 'palhaço' de outro?

Que gêneros de conflitos esses atores exibem sobre a corda insegura amarrada nas duas torres seguras? Torres que olham, vigiam ... e defendem  cavalos, bispos e reis; e (quem sabe?) peões.

À luz das construções teóricas de Émile Durkheim, direi - inclusive para fazer pensar - que nas duas primeiras ecologias (montanha e caminho para a cidade) reinaria a solidariedade orgânica; na cidade dominaria a solidariedade mecânica. Ainda sob esta douta luz, arriscarei que o equilibrista põe em xeque - 'desequilibra' o status quo (a ordem vigente, conformada e resignada) da cidade e de seus habitantes. E o que atrai toda essa gente à praça principal para ver o "show" do saltibanco é a necessidade (reprimida) de mudanças sociais. O saltibanco representa a representação da Democracia; contra o despotismo, ele é a ameaça em pessoa, ato e cosnequência.

O 'palhaço' é o representante da representação da Ditadura, do autoritarismo/ falei tá falado/ não quero discussão/ do "você calado já está errado". O 'palhaço' é o poder ditatorial que, no livro, vence a ousadia subversiva do equilibrista, mata-o. Homicídio doloso? Homicídio culposo? - Ora amig@s ... não importa!. É o Estado se autoatribuindo o poder de matar, através da pena de morte com  que o 'palhaço' condena o saltimbanco. É o Estado como se dissera: "faça o que eu mando, não faça o que eu faço".

Zaratustra, outro questionador do status quo ... do conformismo coletivo, não perde por esperar. Zaratustra identifica-se com o equilibrista, a ponto de carregar seu cadáver, horas e horas, retirando o corpo e a memória daquele ousado questionador daquele universo de solidariedade(s) mecânica(s) pintado, esculpido e assinado pelo todo-poderoso-ditador 'palhaço'. Por força dessa identificação ele é julgado e ameaçado pelo 'palhaço'. Por força dessa identificação, Zataustra é ridicularizado pelos coveiros da liberdade que têm medo do contágio trazido pelo cadáver e pelo que ele representa.

Zaratustra leva o corpo, do "cão", do "animal asqueroso" para longe dalí; sepulta-o no oco do tronco de uma árvore .. longe dos ataques dos lobos ... de todos os lobos ... Sim, todos  os lobos.

Senhores e senhoras, ou acreditamos em Hobbes ou não acreditamos que "o homem seja lobo do homem".

Sim neste momento, às 17 horas e  trinta minutos deste último domingo de fevereiro/2011, no Oriente Médio, nos "países árabes" ... quantos "palhaços" caíram, fugiram, ou estão na 'corda bamba' ou estão prestes a cair dela?

Quanto são os equilibristas mortos, vivos .. mas todos bem sucedidos? Precisa, ainda, perguntar quem é o Super-homem que  Zaratustra  traz à cidade .. todas as cidades ... ou basta ler as notícias internacionais (Oriente Médio) dos jornais e revistas das últimas semanas?

Não sou eu, Vicente,  quem assim vos fala. É que assim falou Zaratustra.


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( Recomendo-lhes a leitura/releitura de ASSIM FALOU ZARATUSTRA: UM LIVRO PARA TODOS E PARA NINGUÉM, de Nietzsche)





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