sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

ZARATUSTRA: DA MONTANHA PARA A CIDADE (5)

ZARATUSTRA: DA MONTANHA PARA A CIDADE (5)


"Quanto mais me elevo, menor fico aos olhos de quem não sabe voar"
.
Nietzsche



Súbito, a multidão estava como que anestesiada. O saltibanco já estava em evolução, no meio do trajeto sobre a corda entre as duas torres,  uma pequena porta se abriu para a saída de  um homem vestido de palhaço, correndo sobre a corda na direção do equilibrista, e gritando:

"Toca a avançar, ó coxo ... avança paspalho, sonso, cara de enterro! E toma tento e não te vá eu espevitar com a ponta do sapato! Que fazes tu entre essas duas torres? Dentro da torre é que é o teu lugar, devis ser lá fechado. Assim impedes o caminho de quem vale mais que tu.



Mais e mais o palhaço avançava e cada vez menos a multidão hipnotizada respirava, quando o 'palhaço' soltou um grito aterrorizante e pulou por sobre o saltimbanco que perdeu o equilíbrio; soltou a vara e despencou caindo desajeitado sobre o chão. A queda abriu uma espécie de 'clareia' na turba. Todos fugiram da praça para diversas direções. Somente Zaratustra permaneceu imóvel, contemplando o corpo que tombou precisamente  ao seu lado. Praça vazia, ao recobrar a consciência, o equilibrista viu Zaratustra ajoelhado diante de si. E um diálogo precioso marcou  a solidão dos  dois homens:

Equilibrista - "Que fazes aqui? Já de há muito sabia que o Diabo viria a passar-me uma rasteira. E agora arrastar-me-á com ele para o inferno; podeis impedí-lo?

Zaratustra - "Por minha honra, amigo, tudo isso que falas não existe; não há Diabo nem inferno. A tua alma vai morrer ainda mais depressa que o teu corpo; não temas pois."

Equilibrista, com olhar desconfiado  - "Se falas verdade, nada perderei ao perder a vida. Não valho mais que o animal a quem ensinaram a dançar, à força de maus tratos e pouca comida."

Zaratustra - "Não é assim. Fizeste do perigo o teu ofício, e isso nada tem de desprezível. Agora vais morrer por causa desse mesmo ofício, e com as minhas mãos te enterrarei".

Sem nada mais poder dizer, o morimbundo tremeu a mão procurando  a mão de Zaratustra como se desejasse lhe agradecer.

A noite chegava na praça vazia onde comçava a escurecer. Zaratustra, mergulhado em seus pensamentos, continuava sentado junto ao morto.  Mas o veu escuro da noite, cada vez mais  fria, cobriu definitivamente a cidade. Zaratustra levantou-se e entoou um monólogo que acabava assim:

(...)

"Escura é a noite, escuros são os caminhos de Zaratustra. Vem, companheiro rígido e gelado! levar-te-ei para longe e, com minhas próprias mãos, te darei sepultura".

Zaratustra colocou o cadáver sobre as costas e começou a caminhar.

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(Amanhã, sábado, continuemos a acompanhar Zaratustra)

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