quarta-feira, 21 de julho de 2010

CHÃO ... (5.1) Copacabana, calçadas de pedras portuguesas em Copacabana

CHÃO DE MEMÓRIAS URBANAS (5.1)- Calçadas de pedras portuguesas em Copacabana


MOSAICOS DO BRASIL, apresentados por Gougon, jornalista, mosaicólogo (hgougon@hotmail.com)


A chegada da pedra portuguesa ao Brasil


No Brasil, a escolha de Pereira Passos para prefeito do Rio de Janeiro no alvorecer do Século XX veio abrir um novo ciclo de desenvolvimento urbano para a cidade. Já era um homem septuagenário, havia estudado em Paris, onde bebeu da experiência revolucionária que Haussmann empreendera na cidade, após a derrota da Comuna, rasgando avenidas majestosas e dando à capital francesa a feição que guarda ainda hoje. Conhecido como o "bota abaixo", Pereira Passos arrasou com o morro do Castelo, pondo por terra cerca de 600 casas e rasgando a fórceps a chamada Avenida Central, em 1905, que seria rebatizada de Avenida Rio Branco, dois dias depois da morte do Barão, em 1912.


Para calçar a nova Avenida, fez vir de Portugal um grupo de calceteiros portugueses e, também, as pedras portuguesas (calcáreo branco e basalto negro). A quantidade era enorme e, além de calçar toda a Avenida, com desenhos variados, conforme o local onde era aplicado, as pedras ainda foram calçar, em 1906, a Avenida Atlântica, construída também por sua iniciativa, viabilizando os bairros de Copacabana e do Leme através da abertura do túnel do Leme no início daquele ano.

Pereira Passos foi o grande modernizador da cidade do Rio de Janeiro. Deve-se a ele, igualmente, a decisão de construir o Teatro Municipal, uma reprodução menor do Teatro da Ópera de Paris, onde buscou inspiração e até obras dos artistas que a ornamentaram, como foi o caso do atelier parisiense do mosaicista Gian Domenico Facchinna, o grande italiano da região do Frioul, a quem a História deve a invenção do mosaico de colocação indireta. Mas esta é outra história para outro capítulo, a ser contada depois com mais detalhes.

As importações de pedras portuguesas efetuadas por Pereira Passos nunca mais se repetiram. Logo foram identificadas enormes jazidas próximas ao Rio de Janeiro, mas a denominação das pedras ficou. Hoje, suas extrações são variadas e espalhadas por todo o país, mas é de se destacar o Paraná como um dos maiores fornecedores.


Em Copacabana, o desenho das ondas, imitando o mar, ficou para sempre com a cara do bairro, tornando-se um logotipo internacional. O desenho foi trazido pelos calceteiros portugueses, mas não tinha então a volúpia curvilínea que se nota hoje. Um bom testemunho é a foto, muito divulgada desde 1922, retratando a marcha dos 18 do Forte que no dia 5 de Julho daquele ano rebelaram-se contra o governo e fizeram um pacto de morte, enfrentando as forças legalistas infinitamente mais numerosas e mais equipadas. Do movimento, sobreviveram apenas dois oficiais, com muitos ferimentos: os tenentes Siqueira Campos e Eduardo Gomes. O gesto heróico iria marcar o início do movimento tenentista, que teria presença avassaladora na vida política do país até a morte do último "tenente", o marechal Cordeiro de Farias, no início do governo Figueiredo. Mas este já é outro mosaico, o mosaico da vida política brasileira, para ser conversado em outro espaço.


Para concluir, vale observar que o primeiro calçamento de "ondas", criado e executado pelos calceteiros portugueses, não levava em consideração as ondas da praia, ignorando o padrão conceitual de dar-lhes "continuidade" ao movimento das ondas. Ao contrário, as "ondas" do desenho original eram modestas em sua curvatura e perpendiculares às ondas do mar.

O paralelismo só foi adotado no início dos anos 30, depois que mais uma ressaca das grandes arrebentou com boa parte do piso. Mais pra frente, durante a grande reforma dos anos 70, que duplicou a pista e a extensão da praia, o paisagista Roberto Burle Marx assumiu a responsabilidade de refazer a orla.


Calçada da praia em frente ao Copacabana Palace


No calçamento junto à praia o paisagista teve o bom senso de manter o mesmo desenho de curvas, sugerindo o paralelismo às ondas do mar. Apenas sensualizou as curvas, ampliando-as até o limite do calçadão.

Com o alargamento da Avenida Atlântica, que ganhou duas pistas de tráfego e um canteiro central, Burle Marx ocupou todos os espaços das calçadas, elaborando desenhos tanto para o calçamento junto aos prédios quanto para o piso da área central da pista.

Os calceteiros portugueses que fizeram as calçadas da Avenida Rio Branco entre 1905 e 1908 também pavimentaram a área em frente ao Teatro Municipal, depois conhecida por Cinelândia. O piso original foi mantido por muitas décadas. Ao final dos anos 90 e início do século XXI, o prefeito César Maia modificou o calçamento da Cinelândia e de muitas outras áreas públicas do Rio de Janeiro, dando uma feição mais moderna às calçadas, mas fazendo uso, também, das velhas e práticas pedras portuguesas.




Fontes

Livros:
"Olhar o chão", Editora CAsa da Moeda, Lisboa. (Ana Cabrera, Marília Nunes e Henrique Dias), 1990

"Mesmo por baixo dos meus pés (uma viagem pela Calçada Portuguesa)", de Ernesto Matos, Edição de autor, 1999

"Catálogo Panorama", da Bisazza Mosaico
sites: http://www.jornaldapaisagem.com.br/artigos/set_art-001.htm

Burle Marx: O Brasil nas calçadas de Copacabana por Edgardo Mário Ruiz
Fotos: Piso do Castelo de S. Jorge, Lisboa, 1842
Praça dos Restauradores, Lisboa,Fragmento de piso de calçada com pedras multicoloridas, Lisboa, Marcha dos 18 do Forte, Copacabana, 1922
Curvas atuais do calçadão de Copacabana, Burle Marx
Vista de cima do calçadão de Copa próximo aos prédios, Burle Marx

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