sábado, 3 de julho de 2010

A ALMA NOTURNA DAS CIDADES (1) - POEMA DOS OLHOS DA AMADA

A ALMA NOTURNA DAS CIDADES (1) - POEMA DOS OLHOS DA AMADA

"A alma da rua só é inteiramente sensível a horas tardias. Há trechos em que a gente passa como se fosse empurrada, perseguida, corrida – são as ruas em que os passos reboam, repercutem, parecem crescer, clamam, ecoam e, em breve, são outros tantos passos ao nosso encalço"

(João do Rio - "A alma encantadora das ruas")


A ALMA NOTURNA DAS CIDADES é o título das diversas postagens que, a partir de hoje - sábado dia 3 de julho de 2010 - estaremos a fazer. Inspirei-me no título do livro do poeta e escritor carioca João do Rio, "A alma encantadora das ruas". As postagens exibirão produções, textos, ensaios nos variados campos gnosiológicos (campos do conhecimento): poesia, prosa, ciências, letras de músicas, filosofia, religião, mitologia ... que traduzam a cidade à noite, quando a noite cobre a cidade, corpo e alma, com seus véus nem sempre escuros, nem sempre freneticamente coloridos, nem sempre diáfanos, nem sempre impenetráveis, nem sempre seguros, nem sempre ameaçadores ... nem sempre todos os gatos são pardos ... nem sempre prazeres, nem sempre gritos de dor. Nem sempre vida, nem sempre morte. Nem sempre a cidade, mas sempre a cidade.

Vicente D. Moreira



Vamos, pois, começar?

Comecemos com uma poesia de Vinicius de Moraes; vamos invadi-la, vamos ocupar esta poesia de Vinicius como posseiros apaixonados pela cidade, pelas cidades, e nesse ato de ousadia, e de heresia, e de fantasia ... vamos nomear a amada de cidade e a cidade de amada ... vamos cantar os olhos noturnos e cheios de mistérios dessa nossa amada mulher amada chamada cidade:


POEMA DOS OLHOS DA AMADA

Vinicius de Moraes


Oh, minha amada
Que olhos os teus
São cais noturnos
Cheios de adeus
São docas mansas
Trilhando luzes
Que brilham longe
Longe nos breus

Oh, minha amada
Que olhos os teus
Quanto mistério
Nos olhos teus
Quantos saveiros
Quantos navios
Quantos naufrágios
Nos olhos teus

Oh, minha amada
Que olhos os teus
Se Deus houvera
Fizera-os Deus
Pois não os fizera
Quem não soubera
Que há muitas eras
Nos olhos teus

Ah, minha amada
De olhos ateus
Cria a esperança
Nos olhos meus
De verem um dia
O olhar mendigo
Da poesia
Nos olhos teus



*******


Dizer o que (?) ... se todo o poeta "é um fingidor/ finge tão completamente/ que chega a fingir que é dor/ a dor que deveras sente" (Fernando Pessoa)

Dizer o que (?), se Vinicius chega a fingir que é uma mulher a cidade que deveras ele sente, se ele chega a fingir que é uma cidade a mulher que deveras ele sente ...

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