domingo, 29 de maio de 2011

TEMPOESIA NA CIDADE - EURICO ALVES/MANUEL BANDEIRA



TEMPOESIA NAS CIDADES - POSTAGENS DOMINICAIS DE POESIAS QUE EXIBAM  ALGUM DESTAQUE À CIDADE

ELEGIA PARA MANUEL BANDEIRA

Eurico Alves

Estou tão longe da terra e tão perto do céu,
quando venho de subir esta serra tão alta ...


Serra de São José das ltapororocas,
afogada no céu, quando a noite se despe
e crucificado no sol se o dia gargalha.
Estou no recanto da terra onde as mãos de mil virgens
tecem céus de corolas para o meu acalanto.
Perdi completamente a melancolia da cidade
e não tenho tristeza nos olhos
e espalho vibrações da minha força na paisagem.


Os bois escavam o chão para sentir o aroma da terra,
e é como se arranhassem um seio verde, moreno.


Manuel Bandeira, a subida da serra é um plágio da vida.
Poeta, me  dê esta mão tão magra acostumada a bater nas teclas
da desumanizada máquina fria
e venha ver a vida da paisagem
onde o sol faz cócegas nos pulmões que passam
e enche a alma de gritos da madrugada.
Não desprezo os montes escalvados
tal o meu romântico homônimo de Guerra Junqueiro
Bebo leite aromático do candeial em flor
e sorvo a volúpia da manhã na cavalgada.
Visto os couros do vaqueiro
e na corrida do cavalo sinto o chão pequeno para a galopada.


Aqui come-se carne cheia de sangue, cheirando a sol.

Que poeta nada! Sou vaqueiro.
Manuel Bandeira, todo tabaréu traz a manhã nascendo nos olhos
e sabe de um grito atemorizar o sol.


Feira de Santana! Alegria!

Alegria nas estradas, que são convites para a vida na vaquejada, alegria nos currais de cheiro sadio,
alegria masculina das vaquejadas, que levam para a vida
e arrastam também para a morte!

Alegria de ser bruto e ter terra nas mãos selvagens!

Que lindo poema cor de mel esta alvorada!

A manhã veio deitar-se sobre o sempre verde.

Manuel Bandeira, dê um pulo a Feira de Santana
e venha comer pirão de leite com carne assada de volta do curral
e venha sentir o perfume de eternidade que há nestas casas de fazenda,
nestes solares que os séculos escondem nos cabelos desnastrados das noites eternas


venha ver como o céu aqui é céu de verdade
e o tabaréu como até se parece com Nosso Senhor
.


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Em carta não datada a Aline Olivais (possivelmente de 1931) o poeta conta a história do seu poema escrito para Manuel Bandeira: "Li a Elegia Para Manuel Bandeira a Carvalho. Uma das melhores coisas que você já fez - disse-me. Não creio. Palavras ocas, ouvidos moucos. Arrebatou-me a cópia e mandou-a para o Rio. disse-me, para Manuel Bandeira. Eu não queria. Poderia parecer demonstração de cabotinismo".
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ESCUSA

Manuel Bandeira

Eurico Alves, poeta baiano,
Salpicado de orvalho, leite cru e tenro cocô de cabrito.
Sinto muito, mas não posso ir a Feira de Sant'Ana.

Sou poeta da cidade. Meus pulmões viraram máquinas inumanas e aprenderam a respirar o gás carbônico das salas de cinema.
Como o pão que o diabo amassou.
Bebo leite de lata. Falo com A., que é ladrão.
Aperto a mão de B., que é assassino.
Há anos que não vejo romper o sol, que não lavo os olhos nas cores das madrugadas.

Eurico Alves, poeta baiano, Não sou mais digno de respirar o ar puro dos currais da roça.


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