HASSENPFLUG –
CENTRALIDADE URBANA (7)
CENTRALIDADE URBANA
Dieter Hassenpflug
Dieter Hassenpflug
(Prof. Dr. phil.habil.) é professor da Cátedra de Sociologia e História Social
da Cidade desde 1993, na Universidade Bauhaus, em Weimar. Desde 2006 é o
diretor do Instituto de Estudos Urbanos Europeus (IfEU). Diretor do Programa
Internacional de Doutorado (IPP), patrocinado pelo DAAD (Serviço Alemão de
Intercâmbio Acadêmico). Atualmente é professor visitante da Universidade
Tongji, em Xangai. Publicou vários livros e artigos em alemão, inglês e chinês.
(Continuação)
A centralidade não
estava na agenda – falando precisamente: não era uma prioridade. O fordismo
planejava a cidade social. A máquina, isto é, o uso da ciência e da tecnologia,
era considerado o melhor meio de pôr em prática esta idéia. Enquanto objetivava
uma visão urbana de alto desempenho retratando eficiência, velocidade e
especialização espacial, a produção espacial fordista não estava interessada
nem em centros urbanos como na centralização como uma estratégia de
desenvolvimento urbano. Muitos projetos de vizinhanças do século XX,
especialmente da Bauhaus (fundada em 1919 em Weimar), da reconstrução após
Segunda Guerra e da produção espacial durante a era comunista comprovam esta
indiferença à centralidade. A cidade fordista se manifestava fundamentalmente
como uma antítese da cidade medieval com a sua funcionalmente e altamente
integrada centralidade cívica. Walter Gropius, Mies van der Rohe, Ludwig Karl
Hilberseimer e outros, apesar de grandes arquitetos que trouxeram ao mundo (até
então clássico) um novo estilo, expressando uma estética da ciência e da
tecnologia, eram relutantes em manter e reinterpretar a herança urbana da centralidade
do passado. Esta atitude antiurbana os provou como representantes da
modernidade fordista. Por outro lado,
deve-se reconhecer que a rejeição da centralidade urbana tradicional não
significou o fim da centralidade espacial. Extraordinariamente, a idéia da
centralidade sobreviveu – em uma nova forma e formato. Como ela pôde
sobreviver? A resposta é: ela sobreviveu por causa do incessante e indiscutível
poder ontológico da centralidade urbana. O fordismo não pôde e não questionou o
centro da cidade como sendo o espaço de maior significado simbólico e melhor
acessibilidade. E como ela sobreviveu? A resposta é: ela sobreviveu como um
subsistema especializado da máquina urbana funcionalmente diferenciada. O
fordismo confrontou práticas da produção do espaço urbano com a questão de como
combinar a idéia da especialização funcional com o inevitável fato da
centralidade urbana.
A mais popular
resposta tem sido a zona de pedestres (calçadão), a qual teve êxito em
recodificar a antiga textura dos centros das cidades européias. Ela confirmou a
prioridade fordista ao automobilismo, ao excluir o carro dos centros medievais
e submetendo-o à periferia. Ela ajudou a mediar o desenvolvimento da expansão
urbana, cidades exteriores ou adjacentes. A carreira do mono espaço de
pedestres começou após a Segunda Guerra Mundial – e exerceu uma extraordinária
influência no desenvolvimento da faixa e do centro comerciais americanos (22).
A grande vantagem da zona de pedestres se baseava na sua habilidade de usar
antigos centros urbanos medievais, sua atmosfera, intimidade espacial, escala
humana e especialmente os seus espaços públicos encenados para propósitos
comerciais. Desde então o comércio varejista tem se transformado no mais
importante defensor da centralidade urbana, e a manutenção desta zona acessível
aos clientes se tornou um desafio contínuo para o planejamento urbano.
Outra prática da
centralização fordista pode ser encontrada em projetos de habitação
socialistas. Estes assentamentos eram basicamente mono estruturados e
suburbanos. Por causa da sua localização periférica, geralmente surgia a
necessidade de assegurar o acesso de algumas carências básicas individuais e
sociais. Por esta razão, alguns dos conjuntos eram equipados com os então
chamados centros de vizinhança, variando dos centros urbanos sócio-culturais
anteriores. Um bom exemplo de uma reinterpretação proletária muito difundida da
centralidade social é o assentamento fordista alemão oriental Halle-Neustadt,
planejado por Pöelzig – e o adepto da Bauhaus, Richard Paulick. Sua nova cidade
nos mostra um tipo de centro de vizinhança provedor de alguns serviços sociais
essenciais e instalações públicas como jardins-de-infância, escolas, banhos
públicos, biblioteca, hall, assim como algumas oficinas, lojas e supermercados.
Alguns arquitetos
modernistas e designers urbanos não atuaram sem a centralidade, quer dizer, sem
os elementos da centralidade. Sobretudo, esta observação se refere a Le
Corbusier. Seus esboços da “Cidade Radiosa”, “a Cidade Contemporânea” e o Plan
Voisin são bons exemplos desta consideração. La Ville Contemporaine, um esboço
que nos remete ao arquiteto Moll do conselho do bem-estar do século XVIII, nos
mostra um diferenciado centro acentuado por estações de trens e táxis aéreos.
Vinte e quatro arranha-céus para escritórios e uma multidão de prédios menores
abrigavam algumas instalações como lojas, cafés, restaurantes, etc. Os
moradores da cidade foram banidos às cidades-jardim suburbanas. O Plan Voisin,
desenhado para substituir grandes partes do centro existente de Paris,
consistia em 18 edifícios altos e residenciais os quais acentuavam um tipo de
centralidade proletária na paisagem da cidade.
Para resumir,
podemos recordar o fato de que as práticas européias de centralização fordista
apresentam algumas
convergências em relação ao CBD americano. A zona de
pedestres (em alemão: Fussgaengerzone) poderia ser considerada um reflexo
europeu do centro de negócios americano, como um mono espaço comercial que usa
as invariáveis características da centralidade urbana e do potencial narrativo
dos centros europeus para melhorar o seu desempenho.
Planejamento reflexivo ou a
reinvenção da cidade centralizada
Hoje sabemos que o
planejamento fordista resolveu muitos problemas no campo da qualidade do ar, da
higiene, do acesso ao espaço verde, da habitação acessível, da justiça social,
etc. Entretanto, sua filosofia de produção espacial tem sido criticada tão
freqüente como drasticamente. Em geral, assinala-se que a aceleração e a
especialização espaciais têm transformado cidades habitáveis em desalmadas
paisagens urbanas de alto desempenho.
Em anologia a
complexa análise deste processo de desvalorização espacial foi condensada na
então chamada “Lei da Especialização Espacial” (23). Para dar um exemplo:
quando espaços públicos multifuncionais altamente integrados (digamos uma rua
com uma vívida vizinhança urbana onde crianças brincam e idosos podem se
encontrar e conversar, lojas e oficinas prestam serviços...) se transformam em
‘infra-estrutura funcional’ (uma artéria veicular mono espacial ou uma
passagem), as funções destruídas e ou excluídas têm que ser reproduzidas por
novas ‘infra-estruturas de substituição’ (playgrounds para crianças, asilos,
centros públicos, parques de negócios, centros comerciais, etc.) Por fim, a
entidade urbana se torna uma máquina funcionalmente diferenciada como sistema
espacial sem nenhum espírito e atmosfera urbana. Agora é o momento da
“infra-estrutura de eventos”, dos espaços que devolvem a qualidade perdida do
espaço central da cidade, a atmosfera, os mitos e a histórias ausentes da
centralidade urbana.
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HASSENPFLUG – CENTRALIDADE URBANA
CONTINUA AMANHÃ, DOMINGO
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