domingo, 10 de junho de 2012

HASSENPFLUG – CENTRALIDADE URBANA (1)


HASSENPFLUG – CENTRALIDADE URBANA (1)

CENTRALIDADE URBANA

Dieter Hassenpflug


Dieter Hassenpflug (Prof. Dr. phil.habil.) é professor da Cátedra de Sociologia e História Social da Cidade desde 1993, na Universidade Bauhaus, em Weimar. Desde 2006 é o diretor do Instituto de Estudos Urbanos Europeus (IfEU). Diretor do Programa Internacional de Doutorado (IPP), patrocinado pelo DAAD (Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico). Atualmente é professor visitante da Universidade Tongji, em Xangai. Publicou vários livros e artigos em alemão, inglês e chinês.

[fonte – Arquitextos ISSN 1809 – 6298 085.00 year 08, jun 2007]

Do meu ponto de vista, existem três definições básicas de “cidade”. Uma delas é precisamente sobre a centralidade urbana.

A primeira definição é uma criação da filosofia da história. Ela categoriza a cidade e a sua história ambas como um produto e produtor da civilização. Deste ponto de vista, a cidade é considerada como uma força espacial que impulsiona o avanço da sociedade e a liberação dos seus vínculos com a tradição (comunidade), assim transformando sociedade em sociedade civil (1). Esta forma de entendimento da cidade como “máquina civilizadora” pertence a diferentes linhas das ciências humanas, representadas, inter alias, por cientistas como Karl Marx, Ferdinand Toennies, Max Weber e Henri Lefèbvre.

A segunda definição é sociológica e conceitua  a cidade como “presença da diversidade e diferença” (2). Embora este fenômeno da diversidade e diferença em grandes cidades fosse freqüentemente experimentado e descrito desde o fim do século XVIII – por exemplo, por Georg Lichtenberg, Charles Baudelaire e Walter Benjamin – foi Georg Simmel quem primeiramente o transformou em conceito chave da nova ciência da Sociologia. Esta definição marca o princípio da sociologia urbana no início do século XX. Louis Wirth, imigrante alemão nos EUA, aluno de Park, Burguess e influenciado por Simmel, introduziu o conceito de cidade enunciado por este último no corpo teórico da Escola de Chicago. Naquele momento, diversidade e diferença foram definidas com base em propósitos empíricos como “heterogeneidade”. Desde então, a cidade é considerada como um lugar caracterizado por tamanho, permanência, densidade e heterogeneidade.

A terceira definição se refere à cidade como lugar de centralidade cultural. As cidades são cidades porque – e quando – elas têm um centro (ou mais centros, por exemplo, uma hierarquia de centro principal, subcentros e centros de vizinhança). Os centros têm grande importância no provimento da forma urbana e de sua coerência. Eles tornam as cidades distintas e legíveis. Como preconizado pela Escola de Chicago, a saber, por E. Burguess e R. Park, o centro urbano é em princípio, o lugar com o maior significado simbólico, o solo mais escasso e a melhor acessibilidade (3). A combinação destes aspectos torna os centros urbanos certamente os espaços mais caros da cidade.

As idéias da “cidade” e do “centro” estão sempre ligadas. As primeiras e as mais antigas “cidades” da história eram híbridos de casas de imperadores divinos: templos e palácios, assim como aquelas derivadas de lugares sagrados centrais. O mais primitivo destes centros enigmáticos poderia ter raízes nas lareiras das tribos da Idade da Pedra. A poderosa magia dos antigos lugares sagrados de reuniões de ritos e cultos os fez finalmente muitíssimo atrativos para os então chamados “grandes indivíduos” (4) ou “grandes homens” (5), em sua maioria líderes militares, ou melhor, líderes tribais. Estes se apoderaram dos centros de cultos, usurparam o totem do clã e, quando as comunidades se estabeleceram, finalmente construíram as suas grandes casas’ exatamente neles. Assim, as primeiras cidades palácio-templo foram criadas.

Apesar dos antigos lugares sagrados das sociedades tribais terem sido executados sob um processo de mais de mil anos de transformações culturais – o seu espírito significativo nunca desapareceu por completo. Nos tempos antigos, as cidades eram consideradas lugares divinos e espaços mágicos habitados por poderosos líderes espirituais e políticos semelhantes a deuses.

Em tempos medievais na Europa, toda cidade queria ser uma espécie de Jerusalém sagrada, e do Renascimento à Revolução Francesa, as imagens da cidade perfeita carregavam as expectativas humanas de possuir o poder da divina razão. Enquanto os lugares centrais modificaram completamente sua aparência e funções, a sua aura permaneceu e reaparece até hoje em diferentes expressões culturais da centralidade urbana.

Dando os primeiros passos para a separação do espaço sagrado do profano pela criação da ágora em aproximadamente 800 A.C., os gregos foram os primeiros a dar à centralidade urbana a face dual de uma Esfinge. Esta separação deve que ser tomada como o resultado de um synoikismo (6) ou synecism (7). Synoikismos deve ser entendido como um meio para evitar a monarquia. Refere-se à fundação de uma irmandade de patrícios rurais assim como uma nova cidade, na ocasião de uma cerimônia de inauguração sagrada. Naquele momento, uma irmandade de soberanos substituiu a monarquia anterior. Estes soberanos denominaram as suas cidades de polis e a sua ação relacionada a ela de democracia (política do povo). Seguindo o exemplo das suas então cidades-mãe (como Atenas), os fundadores construíram uma acrópole (uma cidade templo no topo de uma colina) e uma praça chamada ágora.

A ágora tem que ser interpretada como um tipo de palácio comunitário ou corte de cidadãos – uma versão civil dos palácios-templos anteriores. Este lugar central se mostrou amplo o suficiente para abrigar a Assembléia Popular do povoado em crescimento – durante o período clássico incluindo somente homens gregos maduros possuidores de terras. A primeira democracia da história se constituiu em domínio de proprietários de terras. Esta é a razão pela qual Max Weber denominou a polis de cidade de cidadãos rurais (Ackerbuergerstadt). Mulheres, estrangeiros (em sua maioria comerciantes e artesãos) e escravos eram excluídos da Assembléia do Povo. A ágora simbolizava uma sociedade que, apesar de urbana, permanecia culturalmente centrada na vida rural, como uma instituição semi-urbana.

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amanhã, segunda-feira
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