FORUM COMUNITÁRIO
DE COMBATE À VIOLÊNCIA
Salvador - Bahia - Brasil
Leitura defatos violentos publicados na mídiaAno 12, nº 06, 19/06/2012 |
Quando
a vítima é a notícia
Diante de tantos casos
de crimes que encerram alta periculosidade, os delitos considerados pouco
perigosos se tornam matérias de difícil interesse midiático. Para que um
“modesto furto” venha a integrar a agenda da mídia é necessário que haja algum
elemento peculiar que explique tal atenção. Uma possibilidade concreta se dá,
por exemplo, quando o furtado é uma pessoa muito famosa no meio artístico,
esportivo ou portador de grande fortuna. Nos últimos dias, o jogador chileno Valdivia,
que atua no futebol paulista, deu motivo
para a veiculação ampla e repetitiva de um sequestro-relâmpago sofrido por ele
e sua esposa. O prestígio do desportista imprimiu um nível de noticiabilidade
ao episódio não mais frequente quando este tipo de sequestro vitima indivíduos
desprovidos de glamour midiático. Os traumas decorrentes do ato violento sobre
a vida do casal ganhou espaço nos meios de comunicação, dando-se a impressão de
novidade, quando “a inovação” foi transformar aquele mal-estar que se seguiu ao
fato criminoso, em notícia, pois, certamente, qualquer pessoa que passa por
esta experiência fica perplexa, amedrontada, insegura, enfim. Mas nem todo
entrevistado porta um distintivo como Valdivia, que defende a camisa 10 do Palmeiras.
A vítima de
sequestro-relâmpago não tem garantia de qualquer deferência, afinal, este tipo
de crime saiu da condição de circunstância extraordinária e se encastelou no
cotidiano. Com esta “perda de status”,
a ação criminosa perdeu a gravidade dos seus tempos inaugurais, tirando das
vítimas a aura de nobreza que era emprestada pela sociedade, especialmente pela
classe média, ao se ver possuída pela certeza de ser sequestrável.
Com o tempo, a tal
modalidade de sequestro foi se adaptando a mundos cada vez mais precários,
atingindo alvos inimagináveis, a exemplo de uma cesta básica pedida como
resgate para uma família pobre no Estado do Rio de Janeiro. Não se pode
assegurar que estas incursões do mundo do crime tenham obedecido à dinâmica
econômica do nosso País, que tem se caracterizado por uma inclusão cujos níveis
modestos correspondem à compra regular de produtos alimentares básicos. De
qualquer modo, vivemos em tempos de sequestros para todos os bolsos. E quando
se chega a este grau de transversalidade, a ocorrência criminosa tende a ser
tão inevitável quanto banal.
Assim sendo, quando o
raio do sequestro cai sobre o personagem que foge ao padrão, surge o espanto
reprimido: e a mulher do jogador não quer mais morar no Brasil, ele ainda não
sabe o que vai fazer, afinal, tem custosos compromissos com o time brasileiro.
Estes dramas familiares foram representados de modo tão consistente nos espaços
midiáticos que renderam noticiável o capítulo relativo à captura do suspeito,
fecho já não é habitual nas ocorrências regulares destes crimes os quais,
quando são noticiados, são expressados enquanto fatos brutos sem passado e sem
futuro.
E assim, a novidade é
que o sequestro-relâmpago parece ressurgir do silêncio, mas cabe recordar que
esta visibilidade não vem de um lampejo das indústrias da mídia com o intuito
de revelarem as condições atuais referentes a estes atos criminosos. O sucesso
do caso não vem do sugestivo relâmpago que lhe nomeia, mas do poder de um
grande time, de um grande estado, do País do futebol.
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