quinta-feira, 14 de junho de 2012

HASSENPLUF - CENTRAIDADE URBANA (5)



CENTRALIDADE URBANA (5)

Dieter Hassenpflug

Dieter Hassenpflug (Prof. Dr. phil.habil.) é professor da Cátedra de Sociologia e História Social da Cidade desde 1993, na Universidade Bauhaus, em Weimar. Desde 2006 é o diretor do Instituto de Estudos Urbanos Europeus (IfEU). Diretor do Programa Internacional de Doutorado (IPP), patrocinado pelo DAAD (Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico). Atualmente é professor visitante da Universidade Tongji, em Xangai. Publicou vários livros e artigos em alemão, inglês e chinês.


(Continuação)


A centralidade em tempos proto-modernos

Jefferson, sendo um embaixador na França no período pré-revolucionário (durante o ano de 1770), pôde ter contato com os visionários da paisagem republicana francesa e suas cidades novas. O arquiteto proto-revolucionário Claude Nicholas Ledoux era um deles. Ele foi o designer das primeiras cidades-jardim (ou melhor: cidades republicanas) e posicionou os símbolos de uma nova cultura burguesa nos seus centros: em Chaux (1775-1759), em parte uma cidade construída real, uma casa de um diretor, com duas salinas industriais em ambos os lados, é posicionada no centro, refletindo a emergência da sociedade do trabalho e do capitalismo.

Outro master plan de Ledoux, a cidade-jardim de Maupertuis, antecipou os ideais urbanos da Revolução Francesa com a sua combinação de escola e prefeitura (um ‘templo da razão’). Os templos revolucionários centrados na razão eram edifícios que pareciam montanhas exteriormente e catedrais internamente. Moll, um arquiteto com relações estreitas para com o poderoso comitê do bem-estar, propôs um master plan para uma cidade de 100.000 habitantes. A cidade, com um arranjo em grelha romano, apresentava um tipo de templo público da razão, um híbrido de prefeitura e universidade, localizado no centro. Este edifício proeminente era cercado por quatro jardins, um francês (barroco), um inglês (pitoresco), um chinês (combinando dialeticamente o racional barroco e o pitoresco inglês) e por último, mas não menor, um jardim científico (jardim botânico) simbolizando o espírito da modernidade (17).

Jefferson já estava de volta à América quando o revolucionário comitê do bem-estar, inspirado pelas idéias de Jean-Jacques Rousseau, decidiu transformar a França inteira em um jardim inglês. A idéia era sobre igualdade de justiça social e beleza: uma boa sociedade com uma boa constituição que garante direitos iguais para todos, justiça, liberdade de palavra, etc. se expressam em um paraíso como a paisagem republicana. O jardim inglês era considerado como a representação espacial ideal da república burguesa. Este deve ser tomado como a Broad-Acre-City européia, como uma paisagem sem centro e hierarquia espacial. Mas este projeto falhou desde o princípio. Era muito grande para a França, assim como para uma sociedade de poderes sociais heterogêneos e díspares.

Entretanto, houve um Estado europeu que esteve próximo do ideal de paisagem republicana de Rousseau. Este foi o Principado de Dessau-Anhalt, um pequeno Estado alemão. Localizado no vácuo da grande Prússia, foi abençoado por um compreensivo e moderno pensador admirador das idéias do Iluminismo. Seu nome era Duque Leopoldo III, Franz de Dessau-Anhalt e sua crença também inspirada por Rousseau. Um bom governo seria refletido em uma paisagem pitoresca. Cidade e país belos, por um lado, e liberdade e justiça, por outro, estão juntos (18). Partes dos seus belos estados-jardim ainda existem (Dessau-Woerlitzer Gartenreich).

A idéia republicana de rejeitar a centralidade espacial é uma idéia moderna. Ela permanece como ela realmente era: uma visão. Incrivelmente, a história européia de procura pela “ausência de centralidade” nos ensina sobre o seu colapso. Ao procurar evitar a centralidade espacial, um novo e moderno tipo de centralidade foi criado.

A centralidade urbana nos tempos modernos

De acordo com a centralidade, devemos distinguir entre três períodos históricos (ou tipos de desenvolvimento) da modernidade urbana: crescimento urbano extensivo, intensivo e flexível. Estes períodos devem ser interpretados como camadas que se superpõem e se interpenetram, mas que não substituem a(s) fase(s) precedente(s). Na Europa, o primeiro período começou durante a primeira metade do século XIX. Na Alemanha, tendo a industrialização se iniciado muito mais tarde do que na Inglaterra, este período é então chamado de Gruenderzeit (desenvolvimento incipiente da cidade industrial). Gruenderzeit foi um período no último terço do século XIX, quando muitas empresas, firmas e marcas que existem até hoje (como Siemens) se estabeleceram. Este período é também caracterizado por um rápido crescimento urbano extensivo, estimulado por uma nova economia de mercado orientada para o trabalho, denominada capitalismo. Durante esta fase de incipiente acumulação, as cidades industriais sugaram trabalhadores (operários migrantes) do campo em grandes quantidades, como flutuantes. As cidades passaram por um crescimento explosivo e polarização social.

Entretanto, este desenvolvimento não enfraqueceu a centralidade urbana existente. Pelo contrário! Àquela época, os antigos centros das cidades puderam até melhorar as suas qualidades centrais. Duas são as razões para esse fenômeno: primeiramente a nova sociedade civil, conduzida por uma classe média e alta de empreendedores, banqueiros, intelectuais, artistas, acadêmicos, cientistas, funcionários públicos e muitos outros grupos de profissionais, adicionou “templos civis modernos” aos centros existentes, como teatros, universidades, bibliotecas, salas de concertos, museus, galerias de arte, etc., tornando-os assim mais ricos e mais atrativos. Em segundo lugar, um novo sistema de transporte de massa, que se tornou emblema do progresso e do poder industrial, contribuiu para fortalecer os antigos centros: a ferrovia. Suas rotas em combinação com rodovias arteriais e métodos tradicionais de construção como os edifícios contornando as quadras, asseguraram que o padrão de crescimento urbano continuasse radial concêntrico. A capital prussiana Berlim, uma das metrópoles que mais e rapidamente cresceu no século XIX, é um bom exemplo deste padrão tradicional de crescimento. De todas as direções chegavam trilhos à capital, mas nenhum deles a cruzava. Todas as linhas paravam nas bordas do centro da cidade. Nós contamos cerca de oito destas estações (Kopfbahnhoefe), isto é, estações que os trens não podem atravessar, mas entram e saem pelo mesmo caminho. Estes dois eventos, a atualização cultural burguesa dos centros das cidades e o desempenho dos trens, cuspindo e sugando as pessoas exatamente na borda dos centros das cidades, fez deste o período áureo para a centralidade urbana.

A ascensão da cidade moderna foi experimentada como um choque cultural. Este choque despertou pesadas críticas por toda a Europa. Na Alemanha se propagou uma reação conservadora sobre a experiência da grande cidade moderna. O pioneiro da Sociologia alemã, Ferdinand Tönnies, a quem devemos agradecer por sua notável maneira de distinguir entre “comunidade” e “associação” (também o título da sua muito conhecida magnum opus), e o famoso autor Oswald Spengler (19) são representativos deste ponto de vista crítico. Ambos adoravam a cidade medieval da velha burguesia com a sua centralidade sócio-cultural, seus espaços públicos encenados por belas fachadas empenadas. E ambos detestavam um desenvolvimento urbano que, em sua opinião, levaria à degeneração das boas maneiras, dos padrões morais e o qual distanciava o homem da natureza. No início do século XX (especialmente após a Primeira Guerra Mundial), esta maneira babilônica de encarar a grande cidade moderna se transformou em uma aversão aguda e agressiva pela grande cidade. De acordo com a ideologia do movimento nacional socialista de Hitler, a grande cidade era considerada um espaço infernal produzindo ‘quatro males’, que para serem exterminados, o Fascismo desenrolou a sua e guerra física e cultural: “intelectualismo marxista, especulação capitalista, guetos judaicos desraigados e tecnologia industrial suicida”


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HASSENPFLUG – CENTRALIDADE URBANA  CENTRALIDADE URBANA -´Dieter Hassenpflug
(continua amanhã, sexta-feira)




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