[jornal Folha de São Paulo, São Paulo (SP - Brasil), 18 de setembro de 2011, p. C7]
PEGANDO CARONA NO FUTURO
Gilberto Dimenstein
Engenheiro formado pela Poli (USP) e especializado em transportes, Marcio Nigro anuncia nesta semana uma experiência para gerar dinheiro e, ao mesmo tempo, deixar as cidades menos congestionadas e poluídas. Objetivo: transformar cada dono de automóvel num pequeno empresário, capaz de assegurar uma renda extra mensalmente. "Estou experimentando um jeito de estimular as pessoas a colaborar em questões ambientais e ainda colocar dinheiro no bolso", afirma.
Há algum tempo, ele montou um projeto, chamado Caronetas, de estímulo ao compartilhamento de automóveis entre funcionários das empresas; na cidade de São Paulo, já há 700 empresas cadastradas. Desenvolveu, então, um sistema, patenteado na Suíça, de milhagens para quem compartilha seu veículo, oferecendo pontos para a aquisição de produtos (de passagem de avião a gasolina, passando por comida). Quem vai de carona deposita um valor no sistema de milhagens. Pela tela do computador, são conhecidos os trajetos dos motoristas. É possível ver a lista, por exemplo, das pessoas que vão ao aeroporto em determinado horário.
Pega? Na resposta a essa pergunta, está o futuro das cidades e do nosso modo de viver nelas, pondo em discussão decisões, como a realizada na semana passada pelo governo brasileiro, de estimular a produção de automóveis.
*
O engenheiro espera anunciar sua experiência na próxima quinta-feira, dia 22, durante um seminário sobre mobilidade urbana, quando se comemora o Dia Mundial sem Carro, um dia que, em São Paulo, é comemorado de muitos modos, menos com a diminuição do número de carros nas ruas.
Há, porém, um sério risco de o projeto derrapar na primeira esquina, em colisão com a cultura individualista ou com a insegurança dos motoristas, que temem dar carona a desconhecidos, mesmo com o incômodo da superlotação do metrô.
A tendência mundial, sem dúvida, é a limitação cada vez maior do espaço do automóvel. Indivíduos como Márcio estão aprendendo a ganhar dinheiro com isso. Em alguns casos, muito dinheiro.
*
Na semana passada, uma empresa ganhou o direito de implantar 600 estações de compartilhamento de bicicletas. É uma tendência que já se espalhou por 300 cidades do mundo, inclusive em países como a China, a Índia ou o México.
O apelo da ideia é, em poucas palavras, combinar a consciência ambiental -um problema coletivo- com o interesse individual, ou seja, ganhar dinheiro. Diversas prefeituras americanas perceberam que economizariam dinheiro -além de combater o congestionamento- reduzindo sua frota. Preferem entrar no sistema de compartilhamento de carros, alugando-os por hora. Foi o que fizeram, por exemplo, prefeituras grandes como a de Nova York, a de Chicago e a de Washington.
Empresas que alugam carros por hora, espalhando-os por vários pontos, estão enriquecendo porque perceberam que uma parcela razoável dos consumidores prefere não ter automóvel, pois só precisa dele algumas horas por semana.
A tendência está prosperando tanto que fabricantes de automóveis como a BMW estão experimentando não vender, mas apenas alugar seus modelos. Um laboratório do MIT produz um modelo de carro público ideal para pequenas distâncias, que ocupa o mínimo espaço possível (o carro encolhe quando estacionado) e que será usado no mesmo sistema do compartilhamento de bicicletas.
*
*
Justamente aí progrediu também o compartilhamento de automóveis entre vizinhos, com sites promovendo a intermediação e, para diminuir a insegurança, oferecendo seguro. Novas tecnologias de informação facilitaram o sistema de localização e pagamento. Estão pipocando depoimentos de pessoas felizes com a descoberta de que podem ganhar uma renda extra ao se transformarem em locadores. Até garagens privadas estão sendo compartilhadas.
Estão em discussão não apenas o carro e as cidades mas como será o consumo no futuro. Compartilhar será tão importante como ter.
*
*
PS- Na lógica do consumo colaborativo, a Amazon quer montar um sistema de aluguel como o que o Netflix desenvolveu para filmes. Coloquei uma lista de experiências sobre compartilhamento dos mais variados tipos de produto no www.catracalivre.com.br. Coloquei também detalhes do carro público desenvolvido no laboratório do MIT.
Nenhum comentário:
Postar um comentário