OS FLUXOS DE TRANSPORTE E O CRESCIMENTO DE SALVADOR
Francisco Antônio Zorzo
Professor da Universidade Federal da Bahia
(Salvador – Bahia – Brasil)
Publicado no jornal A Tarde (Salvador, 12/12/2011)
Salvador vem passando por um processo de transformação que tem exigido uma nova concepção do seu sistema de transporte. Salvador cresceu ao ponto de ter, hoje, em sua região imediata, formada por 13 municípios, quase quatro milhões de habitantes.
Os transportes em Salvador se organizam de modo a articular as atividades municipais com a função de capital estadual. Com isso, ocorre uma crescente dificuldade: como resolver os problemas de conjunto? Os municípios da região metropolitana, RMS, e do restante do estado são muito heterogêneos. Na RMS, lado a lado com municípios ricos, como Camaçari, há outros com uma economia muito débil e graves problemas sociais, como Simões Filho.
A dificuldade de solução desse impasse se amplia ao se considerar a relação administrativa da capital com o estado. Pode-se perceber que, enquanto o governo da Bahia dispõe de recursos, a prefeitura de Salvador está quebrada financeiramente. Essa foi uma das lições que ensinou o malfadado Metrô de Salvador, pela falta de uma adequada estratégia financeira e fiscal de parte dos órgãos públicos intervenientes.
Observe-se a concentração dos fluxos na direção Norte da cidade. O centro de Salvador deslocou suas funções para as saídas da cidade. Os indicativos desse deslocamento podem ser observados no deslocamento da região comercial e bancária, na conformação rodoviária do Acesso Norte e no declínio da importância do antigo porto de Salvador, que passou a dividir suas atividades com os terminais da Baía de Todos os Santos.
Hoje as principais vias da cidade se situam longe da zona histórica central. Atualmente, as artérias mais importantes são o acesso rodoviário da BR 324 e a av. Paralela. Cabe constatar a sobrecarga de tais vias, bem como das avenidas de vale, que formaram a solução viária de décadas atrás. Elas estão com um fluxo muito elevado nos horários de pico, o que é motivo de fortes congestionamentos por toda a cidade.
O sistema de transporte coletivo da capital, que movimenta três milhões de viagens por dia por uma complicada rede, há três décadas demanda o transporte de massa. Mas, mesmo com a futura operação do Metrô, enquanto estiver composto de linha de poucos quilômetros, a divisão modal do transporte, vai continuar se concentrando no transporte por ônibus, com mais de 50% das viagens, seguido pelo automóvel. O transporte de ônibus de Salvador se serve de cerca de vinte empresas e possui um total de 500 linhas e uma frota de 2.500 veículos. Essa frota é pequena quando comparada com a de automóveis particulares e esse descompasso pode se agravar com o processo de motorização da metrópole.
Quando se estudavam os fluxos dos ônibus pelas principais artérias, segundo dados da SMTU da época do projeto do Metrô, notava-se que a BR 324 chegava a ter 600 ônibus por hora, seguida das avenidas Paralela, Bonocô e San Martin com cerca de 300 ônibus por hora. Para se ter uma idéia da distribuição desse fluxo, uma avenida como a Oceânica, na Orla, atingia naquela altura um volume horário bem menor, de cerca de 90 ônibus por hora.
O traçado do Metrô estava encetado acertadamente na direção da BR 324, chegando à Estação Pirajá. Com os interesses do mercado imobiliário aliados com os da conjuntura da Copa de 2014, a nova tendência é tornar a av. Paralela o eixo estruturador do transporte de Salvador. A questão é que no entorno dos shoppings Iguatemi e Salvador e da Estação Rodoviária há um grave transtorno de acessibilidade. Isso mostra como o ambiente urbano caótico é resultado de diversas ações que atendem interesses descolados da demanda da população.
O que não pode ser esquecido, o problema maior, é o nó da mobilidade metropolitana. O transporte está diretamente associado à produção, pois a população necessita circular e contar com os recursos necessários à sua sobrevivência. É preciso avaliar o padrão insustentável da mobilidade que atinge Salvador, fruto principalmente do avanço do transporte privado em detrimento do transporte coletivo com integração tarifária. Em outras palavras, para enfrentar o problema, das duas uma: ou a cidade para de crescer ou se estabelece um novo pacto produtivo com oferta de transporte coletivo de qualidade, no sentido de equacionar a sociabilidade e vencer a exclusividade do transporte privado.
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