sexta-feira, 10 de junho de 2011

TUCCI - ÁGUAS URBANAS (3)


TUCCI - ÁGUAS URBANAS (3)



Carlos E. M. Tucci
(continuação) 
A cobertura de coleta de esgoto é de 77% se forem consideradas as fossas (Tabela 2), mas a cobertura de tratamento de esgoto é baixa, comprometendo a qualidade da água, já que contamina os mananciais. Considerando o total da demanda da população de água, a sua carga resultante tratada antes de despejada nos rios é seguramente inferior a 15%. Isso resulta em sete a onze mil toneladas de DBO despejados por dia nos sistemas hídricos brasileiros. Essa poluição provoca doenças de veiculação hídrica e deterioração do ambiental natural. Cada habitante está recebendo um subsídio ambiental por não pagar pelos seus impactos.
No Brasil, as empresas de saneamento nos últimos anos têm investido em redes de coleta de esgoto e estações de tratamento, mas a parcela do volume gerado pelas cidades que efetivamente é tratado antes de chegar ao rio é ainda muito pequena. Algumas das questões são as seguintes:
• Quando as redes de esgoto são implementadas ou projetadas, muitas vezes não foi prevista a ligação da saída das habitações ou dos condomínios a elas. Dessa forma, as redes não coletam o esgoto projetado e as estações não recebem o esgoto para o qual têm a capacidade. O projeto foi elaborado de forma inadequada ou não foi executado como deveria, pois o esgoto continua escoando pelo pluvial para o sistema fluvial.
• Como uma parte importante das empresas cobra pelo serviço de coleta e tratamento, mesmo sem que o tratamento seja realizado, qual será o interesse das empresas em completar a cobertura de coleta e tratamento do esgoto? Outro cenário freqüente é o de aumentar a coleta sem tratamento, agravando o problema à medida que concentra a poluição nos rios. Do mesmo modo, qual é o interesse da empresa na eficiência na redução das perdas se pode transferir os custos para o preço final? Como a empresa terá interesse em reduzir a demanda por racionalização, se isso representará menor receita? Observa-se a falta de indicadores de eficiência para os serviços e de compensações para essa eficiência à medida que a água é racionalizada.
• Quando for implementado o sistema de cobrança pela poluição, quem irá pagar as penas previstas para a poluição gerada?
Essas questões geralmente estão relacionadas com a gestão dos serviços e o desenvolvimento socioeconômico.
Drenagem urbana e inundações urbanas
O escoamento pluvial pode produzir inundações e impactos nas áreas urbanas em razão de dois processos, que ocorrem isoladamente ou combinados:
Inundações de áreas ribeirinhas: são inundações naturais que ocorrem no leito maior dos rios por causa da variabilidade temporal e espacial da precipitação e do escoamento na bacia hidrográfica;
Inundações em razão da urbanização: são as inundações que ocorrem na drenagem urbana por causa do efeito da impermeabilização do solo, canalização do escoamento ou obstruções ao escoamento.
Inundações de áreas ribeirinhas - Os rios geralmente possuem dois leitos: o leito menor, onde a água escoa na maior parte do tempo, é limitado pelo risco de 1,5 a dois anos. As inundações ocorrem quando o escoamento atinge níveis superiores ao leito menor, atingindo o leito maior. As cotas do leito maior identificam a magnitude da inundação e seu risco. Os impactos pela inundação ocorrem quando essa área de risco é ocupada pela população (Figura 1). Esse tipo de inundação geralmente ocorre em bacias médias e grandes (> 100 km2).
Essas condições ocorrem em razão das seguintes ações:
• No Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano das cidades, geralmente não existe nenhuma restrição quanto à ocupação das áreas de risco de inundação, a seqüência de anos sem enchentes é razão suficiente para que empresários desmembrem essas áreas para ocupação urbana.
• Invasão de áreas ribeirinhas, que pertencem ao poder público, pela população de baixa renda.
• Ocupação de áreas de médio risco, de freqüência menor, mas quando ocorre inundação sofrem prejuízos significativos.


O gerenciamento atual não incentiva a prevenção desses problemas, já que, à medida que ocorre a inundação, o município declara calamidade pública e recebe recurso a fundo perdido. Para gastar os recursos, não é preciso realizar concorrência pública. Como a maioria das soluções sustentáveis passa por medidas não-estruturais, que envolvem restrições à população, dificilmente um prefeito buscará esse tipo de solução, porque geralmente a população espera por uma obra. Ao passo que, para implementar as medidas não-estruturais, ele teria que interferir em interesses de proprietários de áreas de risco, que politicamente é complexo em nível local.
Para buscar modificar esse cenário, é necessário um programa em nível estadual ou federal para apoiar tecnicamente as soluções dos municípios, e a educação da população, além de atuação junto aos bancos que financiam obras em áreas de risco.
Inundações por causa de urbanização - As enchentes aumentam a sua freqüência e magnitude em razão da impermeabilização do solo e da construção da rede de condutos pluviais. O desenvolvimento urbano pode também produzir obstruções ao escoamento, como aterros, pontes, drenagens inadequadas, obstruções ao escoamento junto a condutos e assoreamento. Geralmente essas inundações são vistas como locais porque envolvem bacias pequenas (< 100 km2, mas freqüentemente bacias < 10 km2).
À medida que a cidade se urbaniza, em geral, ocorrem os seguintes impactos:
• Aumento das vazões máximas (Figura 2) em várias vezes e da sua freqüência em virtude do aumento da capacidade de escoamento através de condutos e canais e impermeabilização das superfícies.
• Aumento da produção de sedimentos pela falta de proteção das superfícies e pela produção de resíduos sólidos (lixo).

• A deterioração da qualidade da água superficial e subterrânea, em razão de lavagem das ruas, transporte de material sólido e de ligações clandestinas de esgoto cloacal e pluvial.
• Por causa da forma desorganizada como a infra-estrutura urbana é implantada, tais como: (a) pontes e taludes de estradas que obstruem o escoamento; (b) redução de seção do escoamento por aterros de pontes e para construções em geral; (c) deposição e obstrução de rios, canais e condutos por lixos e sedimentos; (d) projetos e obras de drenagem inadequadas, com diâmetros que diminuem a jusante, drenagem sem esgotamento, entre outros.

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Amanhã, sábado, quarta e última parte




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