Segunda-feira, 26 de Agosto de 2013 4:17
Leitura de fatos violentos publicados na mídiaSalvador - Bahia - BrasilAno 13, nº 12, 26/08/2013
| |||
A matéria principal da revista Veja de 7 de agosto de 2013 versa sobre a violência no trânsito brasileiro. Os dados apresentados são de um levantamento feito, a pedido da revista, pelo Observatório Nacional de Segurança Viária. Por sua vez, o Observatório utiliza como fonte, os dados do DPVAT, seguro obrigatório pago aosacidentados. De acordo com esta fonte, “o trânsito causa mais mortes no Brasil doque fazem crer as estatísticas do governo, baseadas no DATASUS”.
|
A forma como é apresentada a disparidade entre os dados do DPVAT e DATASUS sugere que essa última fonte seja governamental e não confiável. Entretanto, deve ser lembrado que, não obstante administrado por um consórcio de seguradoras, o DPVAT (Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre) consiste em seguro social, criado pela Lei 6.194/1974 e regulado pelos Ministérios da Fazenda, da Saúde e das Cidades, com previsão de indenizar vítimas de acidentes automotivos, custear o atendimento médico-hospitalar gratuito e financiar ações de prevenção de acidentes de trânsito no território nacional. Já o DATASUS é o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde do Brasil e está alocado na Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, com a finalidade de coletar, processar e disseminar informação sobre saúde no País.
O caráter comparativo entre as duas fontes de dados, presente na matéria, coloca o Brasil como campeão de mortes no trânsito para o DPVAT ao passo que, pelo DATASUS, o país se encontra em quinto lugar.
Após o trabalho de desclassificação “das estatísticas do governo” – DATASUS – a reportagem prossegue na apresentação da “maior tragédia nacional”, através dos bem classificados dados do DPVAT. Tem-se, então, a curiosa ocultação da fonte dos dados considerados válidos pela revista. Por esta omissão, o DPVAT se coloca como a verdade contra a mentira do DATASUS. Sem explicitar a inserção institucional do DPVAT, ela aparece como um autônomo portador de dados seguros.
O problema das disparidades estatísticas não faz parte desta “tragédia nacional”, alvo da notícia, entretanto, pode ser usado para construir crédito editorial. O emprego a “meio termo” deste tipo de conhecimento tende a trocar um dado por outro sem se preocupar em fazer entender sobre a construção destas informações.
É muito importante que a imprensa utilize dados estatísticos para noticiar questões relevantes para a sociedade, afinal, a complexidade atual e as dimensões dos problemas sociais não permite abordar a realidade usando-se, exclusivamente, as fontes primárias. Por isto mesmo, cabe “traduções” instrutivas das informações colhidas junto aos inúmeros departamentos, institutos, órgãos públicos e privados que produzem dados sempre a partir de parâmetros e métodos necessários à sua compreensão. Caso contrário, podemos cair na mística dos dados e, especialmente, dos donos dos dados.
Há que se reforçar que a importância deste problema está relacionada com a profundidade e extensão dos problemas sociais e a necessidade se ter opiniões cada vez mais consistentes sobre os mesmos. Neste sentido, a mídia deve funcionar como canal de disseminação, capaz de assegurar aos cidadãos o direito à informação.
Quanto ao trânsito no Brasil, não há dúvida quanto à tragédia e as suas raízes culturais, em nosso solo. Aliás, os números preocupantes mostrados na reportagem deveriam ser associados a uma nota constante na página 52 da mesma revista, na sessão Panorama, intitulada “Não há mais vagas”: “A polícia de São Paulo não tem feito blitz em busca de motos e carros irregulares por uma questão prática: não tem onde colocar os veículos apreendidos. Enquanto aguarda parcerias para construir novos pátios, o secretário da Segurança, Fernando Grella Vieira, conseguiu na Justiça permissão para vender 45 000 novos carros e motos apreendidos em lotes, não mais individualmente, o que vai agilizar o esvaziamento dos depósitos. (...)”
Nenhum comentário:
Postar um comentário