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Leitura de fatos violentospublicados na mídiaSalvador - Bahia - BrasilAno 12, nº 12, 20/08/2012 |
DETENÇÃO:
DAS VAGAS REGULARES ÀS SOBRESSALENTES |
16 de agosto de 2012. Às 13
horas e 20 minutos aparecem as manchetes do Jornal Hoje da TV Globo.
Entre as notícias, mais uma série de denúncias relativas à superlotação
em delegacias brasileiras. Desta vez, a “novidade” vem de Santa
Catarina, do interior de uma delegacia situada na Grande Florianópolis.
Na tela, aparece a imagem de um rapaz acorrentado a uma motocicleta. É
um jovem branco que está sentado, segura uma muleta, toma café e tem os
pés algemados e ligados a uma motocicleta através de uma corrente
metálica. De acordo com a notícia, ele está ali (no corredor da
delegacia) desde o dia anterior.
Eram
três rapazes conectados a uma motocicleta por algemas, enquanto
aguardavam vagas em uma unidade adequada à detenção. Para dois deles,
fora encontrado espaço ao passo que o terceiro restou aguardando a sua
vez. O jovem mostrado pelas câmeras não foi entrevistado, sua
participação foi limitada ao nível visual, dando-se, deste modo, um
demonstrativo aos receptores sobre a veracidade quanto à fórmula exótica
de detenção.
A
fala é controlada pelo âncora do telejornal, Evaristo Costa, que
inicia a notícia com o mote: “Agora um flagrante da superlotação de uma
cadeia em Santa Catarina”. É ele que se encarrega da interpretação da
cena visualizada, bem como da sua explicação: “A Secretaria da Justiça
diz que está fazendo remanejamentos enquanto aguarda a liberação de
verbas para a construção de novos presídios”.
Foram
usadas poucas manobras simbólicas para se tornar noticiável a situação e
isto sugere a existência de referências prévias por parte da audiência,
capazes de reconhecer o sentido do acontecimento narrado. É mais uma
daquelas notícias que tratam do excesso humano concentrado no interior
das unidades carcerárias das delegacias. A novidade, desta vez, está no
formato do “preso sobressalente”, aquele que ultrapassa o limite físico
das celas. Entretanto, a existência desta forma de abundância já não
causa, entre nós, motivos para maiores escândalos, muito menos se torna
objeto de grandes reflexões.
Mas,
se voltarmos ao homem que é pura imagem probatória da notícia e
pensarmos que se trata de um ser biológico e que tem necessidades
físicas irrenunciáveis, como reagiremos a tal inquietação? Ao permanecer
mais de 24 horas amarrado a uma motocicleta em pleno corredor da
delegacia, como faz para dormir, para defecar, para urinar, para ficar
de pé? Ele tem direito a asseio, a manutenção da sua saúde, da sua
individualidade...
Agora, se nos voltarmos ao cenário público que encampa a cena descrita e recordarmos que ali não é um set de filmagem e sim um lugar que representa a ordem pública, podemos nos perguntar sobre as garantias que os agentes públicos que ali atuam devem oferecer aos detidos. Onde ficaria resguardada a dignidade dos indivíduos que vivem a experiência de detenção baseada, exclusivamente, na capacidade física do espaço?
E
uma última interrogação importante: que caminhos estão sendo trilhados
para a superação das condições que têm determinado a multiplicação
acelerada de crimes?
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