[fonte - jornal Folha de São Paulo, São Paulo (SP - Brasil), 24 de julho de 2012, p. A3]
FORA DAS RUAS E EM LUGAR NENHUM
Raquel Rolnik, Bruno Miraglia e Juliana Avanci
Desde os
anos 60 tentam tirar ambulantes da rua. O prefeito fortaleceu essa política.
Vamos jogar essas pessoas vulneráveis na miséria e na marginalidade?
As ruas
de São Paulo começaram a ser utilizadas para comércio ambulante a partir da
transição do trabalho escravo para o trabalho livre, nos idos de 1850. A
primeira norma municipal de regulação da atividade foi a lei 292/1969, sobre “o
modo de fiscalizar os mercadores ambulantes”.
Tal
atividade resistiu por mais de um século a todos os ciclos econômicos – e
atravessou o tempo adquirindo características próprias até o cenário atual, que
consolidou como referências nacionais redutos de comércio popular em bairros
paulistanos, como o Brás, 25 de março, República, Sé, entre outros.
Os Termos
de Permissão de Uso foram concedidos em São Paulo desde 1965 para ambulantes de
plantas ornamentais e estendidos como reserva de mercado aos deficientes
físicos em 1986. A primeira tentativa de extinção dos ambulantes na cidade foi
tomada por Ademar de Barros em 1960 – que se viu obrigado a
recuar da decisão,
por pressão social.
Essa
política regulatória busca propiciar o desenvolvimento urbano e econômico
local, criando oportunidades para geração de trabalho e renda, em especial aos
trabalhadores mais vulneráveis, como idosos, deficientes e pessoas com baixa
escolaridade, que têm menores chances de obter rendimentos de outra forma.
Desde
2009, a Prefeitura de São Paulo intensificou a (des)política de extinguir o
comércio ambulante existente há décadas na cidade.
Sem qualquer planejamento de oferta de outras oportunidades e nenhum debate
público, os pontos de comércio são extintos e os ambulantes removidos. O
prefeito anuncia, às vésperas do fim do mandato, a construção de shoppings
populares nas periferias, sem demonstrar qualquer previsão orçamentária,
terrenos disponíveis ou mesmo projetos e estudos dos locais. Tampouco há
qualquer participação popular na tomada dessas decisões.
Diante do
risco à ordem socioeconômica, a Justiça determinou no dia 4 de junho a
paralisação das remoções, tendo como fundamento:
- Falta
de participação popular;
- Indícios de que a Constituição e as leis foram ignoradas;
- Que a decisão do prefeito é desproporcional e desarrazoada;
- Ausência do devido planejamento urbano;
- Indícios de ilegalidade quanto ao direito de defesa;
- Ilegalidade por falta de prévia oitiva das comissões permanentes de ambulantes, entre outros.
- Indícios de que a Constituição e as leis foram ignoradas;
- Que a decisão do prefeito é desproporcional e desarrazoada;
- Ausência do devido planejamento urbano;
- Indícios de ilegalidade quanto ao direito de defesa;
- Ilegalidade por falta de prévia oitiva das comissões permanentes de ambulantes, entre outros.
Essa
decisão foi confirmada em 27 de julho por 22 dos 25 desembargadores do Órgão
Especial do Tribunal de Justiça. Isso demonstra que a manutenção dos
ambulantes legalizados há décadas na cidade se mostra indispensável até que o
município apresente uma alternativa concreta, urbanística, socialmente
defensável e aberta ao debate público, ainda que com reassentamento
alternativo. Isso irá evitar o rompimento da atividade comercial, desemprego,
miséria e marginalização.
Como bem
afirmado pelos desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo, a cidade de
São Paulo ainda é uma “Berlíndia” (uma mistura de Bélgica com Índia), o que
exige que a Justiça garanta o direito de todos, em especial dos mais
vulneráveis, a uma cidade justa e, de fato, heterogênea.
______________________
RAQUEL
ROLNIK, 55, é
urbanista e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP
BRUNO MIRAGAIA, 33, é defensor público de São Paulo
JULIANA AVANCI, 30, é advogada do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
BRUNO MIRAGAIA, 33, é defensor público de São Paulo
JULIANA AVANCI, 30, é advogada do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos
Nenhum comentário:
Postar um comentário