quinta-feira, 5 de julho de 2012

OJIMA ,,,, CIDADES DORMITÓRIO (1)


OJIMA, SILVA e PEREIRA -  A Mobilidade Pendular na Definição das Cidades-Dormitório (1)

A Mobilidade Pendular na Definição das Cidades-Dormitório:
caracterização sociodemográfica e novas territorialidades no
contexto da urbanização brasileira

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Este estudo foi desenvolvido no âmbito do projeto "Dinâmica intrametropolitana
 e vulnerabilidade sócio-demográfica nas metrópoles do interior paulista", 
desenvolvido no Núcleo de Estudos de População (NEPO/Unicamp) com o
 financiamento da Fapesp e Cnpq.
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Ricardo Ojima
Doutor em Demografia; Pesquisador Colaborador do Núcleo de Estudos de População
(NEPO/Unicamp) e Departamento de Demografia (DD/IFCH/Unicamp).

Robson Bonifácio da Silva
Geógrafo; Mestrando em Demografia - Departamento de Demografia (DD/IFCH/Unicamp);
Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

Rafael H. Moraes Pereira
Sociólogo; Mestrando em Demografia - Departamento de Demografia (DD/IFCH/Unicamp);
Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).



Resumo:

O uso do termo cidade-dormitório muitas vezes está associado a um conjunto de percepções que não é baseado em dados formais e, dessa forma, considera um conjunto de situações muito distintas. O seu uso normalmente está associado àquelas cidades nas quaisuma parcela significativa da sua população trabalha ou estuda em uma outra cidade, alémde também apresentarem uma economia pouco dinâmica. Serve - como o nome sugere - apenas como local de residência. Este artigo propõe um resgate teórico do que poderia ser considerado como o conceito de cidade-dormitório e, a partir de dados censitários, explora as suas principais características. Trata-se de uma primeira abordagem que incorpora a informação de deslocamento pendular no intuito de avaliar os consensos em torno deste termo.

Palavras-Chave: Cidade-dormitório; Rede Urbana; Pendularidade

Introdução

O termo cidade-dormitório é recorrente na literatura brasileira, sobretudo quando se trata de analisar os processos sociais e demográficos que se desenham dentro dos contextos metropolitanos. Sendo assim, não é raro encontrar referências a cidades que são classificadas dentro deste ambíguo termo, sempre associadas às situações de desvantagem econômica e social em relação a uma cidade que polariza os fluxos regionais tanto pelos aspectos econômicos quanto populacionais.

Mas embora esse termo seja muito presente tanto nos meios acadêmicos como no senso comum, não há um consenso objetivo sobre o que define uma cidade-dormitório. Segundo Faria (1991), os caminhos percorridos pela pesquisa da sociedade urbana no Brasil assumiu uma postura específica onde termos como urbano, cidade, espaço e até região metropolitana, assumem sentidos e significados meramente convencionais sob uma base extensa e plural de temas e perspectivas teóricas.


Assim, o termo “cidade-dormitório” se vinculou aos processos de marginalização e periferização da pobreza nos contextos metropolitanos, especialmente a partir de análises na Região Metropolitana de São Paulo ao longo das décadas de maior crescimento econômico e populacional dessa região. Conseqüentemente, o termo passou a ser empregado em um sentido pejorativo em diversos contextos regionais, como é o caso de Diadema (SP), Jaboatão dos Guararapes (PE), Viamão (RS), Biguaçu (SC) Valinhos (SP) ou Hortolândia (SP), entre outros inúmeros casos facilmente encontrados através de uma rápida pesquisa na mídia impressa e digital.

Os governos locais tendem a se proteger do rótulo de ser uma “cidadedormitório” devido a esta carga ideológica negativa que permeia essa classificação. Trata-se de cidades que se constituem sob um significativo crescimento populacional devido à imigração das camadas de média e alta renda que procuram residir em municípios mais distantes do seu local de trabalho na busca de melhor qualidade ambiental, menos violência, etc. Surge, portanto, um novo cenário no qual o termo “cidade-dormitório” necessita ser melhor detalhado. Nesse cenário, compreender em escala regional o papel dos deslocamentos populacionai cotidianos (entre o local de residência e de trabalho e/ou estudo) traz novos contornos para se pensar o que se poderia chamar de cidade-dormitório.

O objetivo do trabalho é realizar uma análise das informações censitárias disponíveis para o ano de 2000 no sentido de captar os fluxos de deslocamentos populacionais para trabalho e/ou estudo (deslocamentos pendulares) considerando os municípios de residência onde a parcela populacional é mais significativa, sobretudo, nos contextos regionais urbanos mais dinâmicos do Brasil.

Na primeira parte do trabalho, faremos um breve resgate do emprego do termo cidade-dormitório no contexto da urbanização brasileira. A seguir apresentamos a nformação censitária de deslocamento pendular como uma ferramenta de análise  imprescindível para investigar o bom uso do termo cidade-dormitório e suas interfaces sociais, econômicas e demográficas; neste sentido, apresenta-se também  uma breve caracterização sociodemográfica dessa parcela da população considerando para isso os dados existentes para 1980 e 2000, buscando apontar as possíveis alterações nos padrões de pendularidade e, consequentemente, das cidades-dormitório. Por fim, é realizado um mapeamento das cidades-dormitório de modo a apontar contextos e hipóteses sobre as suas principais características. Enfim, mais do que resolver os dilemas, procurar-se-á encontrar subsídios para identificar e confirmar algumas verdades e mitos sobre o bom uso desse controvertido consenso que é a “cidade-dormitório”.

Cidades-dormitório: conceitos e usos

Bastante utilizado, o termo “cidade-dormitório” apresenta íntima relação com processos demográficos e sociais, principalmente em regiões metropolitanas. Ojima (2007; p.83) aponta que o surgimento da noção de cidade-dormitório àqueles estudos urbanos que trabalhavam sobre a perspectiva dicotômica ‘centro-periferia’.

Porém, ainda seria necessária uma discussão mais ampla para seu enquadramento à categoria de conceito. Após a Segunda Guerra Mundial e, principalmente, com a globalização da economia, a cidade se transforma em um instrumento para obtenção e expansão do lucro de um macro-poder constituído.

Além disso, muitas mudanças ocorrem na esfera econômica, política, e também na reestruturação da hierarquia das cidades e da rede urbana. Segundo Freitag (2002), tais mudanças nos permitem detectar cinco tipos de cidades na contemporaneidade: as cidades globais; as mega-cidades ou megalópoles; as metrópoles; as cidades periféricas; e as cidades-dormitório. Em linhas gerais, a tipificação dessas cidades considera, principalmente, aspectos de infra-estrutura de suporte para participação e efetiva participação econômica em diferentes escalas (local, regional, nacional, internacional e global); condições de vida da população, implementação de direitos humanos, volume e dispersão populacional, etc.

O que mais nos interessa são as cidades-dormitório, frutos da conurbação e da formação de metrópoles que deram um caráter mais complexo ao processo de urbanização. Freitag (2002) considera cidade-dormitório o mesmo que cidade satélite. Em sua análise, o morador desse tipo de cidade não se reconheceria como cidadão da mesma, pois na medida em que ali não se encontra seu local de trabalho e só serve como dormitório e residência, ele não teriam compromisso efetivo com a cidade. Além disso, a cidade-dormitório não teria sua independência administrativa nem econômica própria sendo, portanto, altamente dependente da sede regional a quem se vincularia com grande intensidade. Outra característica que Freitag destaca é a ausência dos direitos humanos e da cidadania na cidade-dormitório, implicando em precárias condições de vida para seus moradores que vivenciam altos índices de violência, insalubridade, epidemias, problemas de trânsito e transportes, agressão ao meio ambiente, entre outros.

Em geral, o termo cidade dormitório costumam ser relacionado a algumas características como baixo dinamismo econômico, elevado crescimento populacional (JARDIM & BARCELLOS, 2006) e expansão urbana em assentamentos precários de população de baixa renda (CAIADO, 2005). Além disso, Miglioranza (2005, p.3) afirma que cidade dormitório é aquela “cidade cujos habitantes saem, na maioria, para trabalhar em outra cidade, voltando apenas para dormir”, sendo, portanto, a mobilidade pendular um elemento característico também importante para o melhor entendimento do objeto de estudo.

Aranha (2005), apesar de fazer muitas referências ao termo, não chega a definir ‘cidade-dormitório’, mas confirma a maior intensidade da mobilidade pendular nesse tipo de cidade. Segundo ele, a Região Metropolitana de São Paulo possui cerca de 1 milhão de pessoas que trabalham ou estudam em municípios diferentes daqueles em que vivem e a capital, São Paulo, surge como o principal receptor da pendularidade metropolitana. Nesse contexto, muitos municípios apresentam saldo negativo no fluxo de pessoas e alguns, como Carapicuíba – onde entram cerca de  mil indivíduos e saem 64 mil (Aranha, 2005: p. 99), são considerados cidades dormitório por conta do expressivo saldo negativo e por não apresentarem uma economia dinâmica.

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(continua amanhã)





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