quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

O LIVRO DO DESASSOSSEGO - Fragmentos do urbano/2

O LIVRO DO DESASSOSSEGO - Fragmentos do urbano/2

Fernando Pessoa (Composto por Bernardo Soares, ajudante de guarda-livros na cidade de Lisboa)

Vicente D. Moreira
vicentedeocleciano@yahoo.com.br

Mais, bem mais, que no ambiente rural, as cidades são molduras mais-que-perfeitas para os solitários. Longe do “todo-mundo-conhece-todo-mundo” e do “todo-mundo-diz bom dia a todo-mundo” próprios das cidades pequenas, em Londres – por exemplo e segundo Caetano Veloso (“London London” – no one here say “hello’. Longe desse “todo-mundo-conhece-todo-mundo” e desse “todo-mundo-diz bom dia a todo-mundo”, há espaço/tempo para o anonimato; para o morar sozinho, o que soaria estranho numa cidadezinha, numa roça; ainda que, a depender do perfil da vizinhança, mesmo numa metrópole esse hábito solitário ... tido como  “antissocial” ... possa causar estranheza. Um conhecido ator brasileiro disse, certa vez, que a única vantagem de morar sozinho é poder sentar na latrina e defecar sem precisar fechar a porta do sanitário. Mas como conforta o dito popular brasileiro, “cada um sabe de si e Deus de nós todos” .

Um solitário atrai outro solitário. A repetição de um ato leva ao hábito. O solitário urbano cultiva hábitos invisíveis para as pessoas e as massas que passam apressadas – mas visíveis para um outro solitário que com ele se identifica. A solidão em si não é o maior problema. O problema é a autocomiseração ... é sentir pena de si mesmo, ter piedade de si mesmo, de sua condição de solitário.    

E os dois solitários urbanos do PREFÁCIO estão longe de terem pena de si mesmos.

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