terça-feira, 4 de outubro de 2011

JOVENS URBANOS, "ENVELHEÇAM DEPRESSA"... (4/ FINAL)

[fonte -  Blogue VIVER AS CIDADES http://www.viverascidades.blogspot.com/]

 
JOVENS  URBANOS,  “ENVELHEÇAM  DEPRESSA”  SE  DESEJAM  VENCER   PELA   EDUCAÇÃO (3)

Vicente Deocleciano Moreira,
Maria da Luz Silva,  
Edna Lucia do Nascimento Macedo.

(FINAL)

A reportagem exibe várias outras situações comuns de jovens que “envelheçeram depressa, logo!”. Brasileiros de diversas regiões  têm em comum em suas biografias o fato de terem ‘envelhecido logo!’ ou – no dizer de Nelson Rodrigues – “terem envelhecido depressa antes que fosse tarde”. Com mais metáfora ou menos metáfora, com mais exagero ou menos exagero, a verdade é que eles e elas destoaram, divergiram do comportamento e estilos de vida, diríamos, esperados e comuns a jovens de suas idades: indisciplina e desleixo nos estudos e na vida pessoal, horas e horas à frente de computadores entregues à TV e a jogos e relacionamentos virtuais, festas semanais (baladas), diversão, farras e excesso de bebidas alcoólicas e, por que não? – drogas, envolvimento com atos públicos de riscos (‘pegas’, roubos, tráfico, etc.) .

Há exemplos de ‘jovens talentos’ que nasceram do século XIX em diante, que “envelheceram logo” e que, talvez, representem o modelo de transição para o novo paradigma que a primeira metade do século XXI começa a construir.  Há alguns anos outra revista, Istoé, publicou edição especial sobre brasileiros bem sucedidos, vencedores, em diversas áreas do conhecimento – tendo como destaque Oswaldo Cruz, intitulado “o cientista do século”, o qual obteve 83,09% dos votos de entrevistados.

Vejamos, no texto biográfico publicado pela Istoé, um pouco da adolescência de cada um:
Oswaldo Cruz, médico sanitarista – 83,09% - “Nascido na pacata vila, hoje cidade, de São Luis do Paraitinga, na Serra do Mar paulista (a 5 de agosto de 1872), aprendeu a ser disciplinado desde cedo. O pai, seu Bento, não perdoava um deslize sequer. Já no Rio de Janeiro, para onde a família – seu Bento, dona Amália e os seis filhos – se mudou em 1877, o velho mandou buscar o menino no colégio porque ele havia esquecido de arrumar a cama antes de sair. “O medo que tinha de apanhar era tanto que, ao ser pego fumando, aos 14 anos, apagou o cigarro na mão”, contou a ISTOÉ Roberto Oswaldo Cruz, bisneto do sanitarista.

Carlos Chagas, médico sanitarista – 82,35% - Desde a adolescência, o espírito do futuro cientista era avoado daquele jeito. Tanto que a mãe, dona Mariana, achou por bem matricular o menino no Colégio Batista, um internato de padres, onde seu tempo seria mais bem aproveitado.(...)

Vital Brasil, médico sanitarista - 77,44% - O desejo de ser médico, contudo, começaria a se materializar quando ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, aos 21 anos. Quase sem dinheiro, não faltaram motivos para abandonar o curso. Os poucos réis, ele ganhava nos plantões da delegacia de polícia, onde trabalhava como escrivão.

Paulo Freire, Educador – 68,60% - Recifense nascido a 19 de setembro de 1921, Paulo Reglus Neves Freire deu suas primeiras aulas de Língua Portuguesa aos 18 anos.
Santos Dumont, inventor do avião – 67,34% - Quando chegou a Paris, aos 18 anos, em 1891, Dumont também provocou risos, sim, mas foi ao pendurar um automóvel numa árvore, em plena praça pública. Ninguém entendeu nada. O então candidato a inventor queria saber se, suspenso, o motor trepidaria – o que não aconteceu como ele imaginava. Até então, ninguém tinha ousado instalar um motor a gasolina num balão porque se acreditava que a trepidação o impediria de subir.

Adolpho Lutz, médico sanitarista -  61,60% - Nascido a 18 de dezembro de 1855, no Rio de Janeiro, Adolpho Lutz  foi levado aos dois anos de idade para a Suíça, terra natal dos seus pais. Só aos 26 anos voltou ao Brasil. Formado em Medicina pela Universidade de Berna, por escolha própria, decidiu trabalhar em um país onde a ciência precisava enfrentar um caminho tortuoso para se desenvolver.

Darcy Ribeiro, antropólogo –53,40% -  Aos 11 anos, o antropólogo Darcy Ribeiro acreditava ter vocação para coroinha. (...). Mal abrandou o surto religioso, não tardou a pulsar a aveia intelectual. Aos 14 anos, mergulhou na literatura pensando conquistar as garotas com o cérebro. “Para enfrentar a concorrência dos rapazes de corpos musculosos, só comia papel”. Seu habitat natural passou a ser a biblioteca do tio Plínio.

Euryclides Zerbini, médico, cirurgião – 45,30% - O cardiologista nasceu prematuro de sete meses, a 7 de maio de 1912, em Guaratinguetá. “Parecia um ratinho. Disseram que ele não ia sobreviver”, conta Eunice Zerbini, 95 anos, irmã do médico. O pai, imigrante italiano apaixonado pela cultura clássica, batizou o filho caçula de Euryclides – os outros se chamavam Eurídice, Eurípedes e Euryale. O jeito linha-dura de seu Eugênio fazia Zerbini devorar os livros, Mas terminou o colégio sem descobrir a vocação. “Você vai ser médico”, sentenciou o pai.

Emílio Ribas, médico sanitarista – 41,78% - Nascido a 11 de abril de 1862, em Pindamonhangaba (SP), Emilio Marcondes Ribas, nunca quis outra coisa que não fosse ser médico.

Cesar Lattes, físico – 39,97% - Não era o que se pode chamar de aluno exemplar no ginásio, apesar do talento para física e matemática: “Não estudava e assim mesmo me saía muito bem nas provas. Mas, no resto, era um aluno medíocre.
Sérgio Buarque de Hollanda, escritor (pai de Chico |Buarque) – 39,14% - Leitor voraz, tinha memória de elefante. Passava horas falando sobre qualquer assunto que surgisse na roda. Não foi à toa que ganhou do poeta Manuel Bandeira o apelido de “chato-boy”. Aos 17 anos, conhecia tudo e mais um pouco de literatura e publicava críticas no Correio Paulista.

Mário Schenberg, físico e matemático – 29,83% - Segundo filho de um casal de judeus eslavos, Mário Schenberg (nascido a 30 de junho de 1914, no Recife) descobriu a paixão pelos mistérios da natureza em solitárias caminhadas na praia ainda rapazote. “Andava horas na praia, catando mariscos. Nesses passeios, comecei a pensar sobre coisas matemáticas.

Adib Jatene, médico cirurgião, aluno preferido do Dr. Zerbini – 25,70% - “Por incrível que pareça, sempre achei que seria melhor engenheiro do que médico” (...). No entanto, no último ano do curso de engenharia, Jatene jogou tudo para o alto e resolveu prestar vestibular para medicina.

Milton Santos, geógrafo – 19,31% - A vocação de professor apareceu cedo. No Instituto Baiano de Ensino, aos 15 anos, ele gastava tempo ensinando os colegas de menor idade no intervalo das aulas, em pleno corredor.

Sérgio Porto, físico – Nascido a 19 de janeiro de 1926, em Niterói (RJ), Porto trabalhava com o raio laser no Bell Laboratório, em New Jersey, nos Estados Unidos, quando se deu conta da importância dessa fonte de radiação para o avanço da medicina.


Evidentemente que o rigor com que o pai de Oswaldo Cruz o tratava não deve servir de modelo para que pais influenciem seus filhos a abraçarem a Educação... mesmo às custas do maior ou menor afastamento do mundo, nem sempre “azul e rosa” e nem sempre marcado pelo ócio destrutivo, que tende a caracterizar o imaginário da infância e da adolescência desses dias (2011).

Em artigo publicado no jornal Folha de São Paulo (16 de dezembro de 2010, p. E10), “Educar Frustrando?”, o psicanalista Contardo Calligaris faz as seguintes observações:

1)      Podemos frustrar nossos filhos de pipoca e videogames, sobretudo quando eles parecem acreditar que tudo lhes é devido, mas imaginar que, com isso, a gente esteja lhes formando o caráter ou lhes ensinando a viver é puro melodrama.
Funciona assim: nós imaginamos que seríamos capazes de mimar as crianças a ponto de elas nunca aprenderem que a insatisfação é o regime normal do desejo.
Será que alguém tem tamanho poder? Não acredito, mas, aparentemente, fortes dessa ilusão, decidimos frustrá-las um pouco para salva-las de nossa suposta (e duvidosa) capacidade de embrutecê-las à força da satisfação.

2)      Também justificamos nossa decisão de recusar e proibir com a idéia de que isso estabeleceria, nas crianças, uma sólida e benéfica idéia de autoridade.
(...)


Proibir as saídas noturnas e o uso prolongado de computador é ótimo e necessário, mas a autoridade que forma o caráter de um jovem não é só a que diz não às suas vontades; é também a que o autoriza a dizer sim na hora daquelas escolhas de vida que são custosas e decisivas e diante das quais é fácil amarelar.



CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados estatísticos que acabamos de expor, mesmo apenas restritos à realidade da educação no Brasil, são capazes de se somarem aos textos e avaliações qualitativas para reforçar a constatação de que, por forças das desigualdades sociais gerais da sociedade brasileira e aquelas que atingem especificamente seus jovens, temos que substituir a singularidade e a idealização da JUVENTUDE pela dura realidade concreta das JUVENTUDES, plurais e desiguais no acesso à educação, à informação, na gestão das próprias vidas afetivas e sexuais, na cor da pele.

JUVENTUDES, notadamente aquelas atingidas pelas variadas formas de exclusão social, incluem nas pautas de luta de seus cotidianos exposto às condições insalubres e limitantes de aprendizagem, de inserção no mercado de trabalho, e de desempenho de atividades de lazer..., mas que lutam  e, com isso, ajudam no combate às desigualdades sociais e na conquista da cidadania.

Trabalho para sustento próprio e/ou de pais, filhos, cônjuges, sob o preço do abandono dos estudos, excesso de bebidas alcoólicas, mau desempenho escolar, festas todo o final de semana, horas seguidas em lan houses, entrega cotidiana e de corpo e alma à academias de fisioculturismo, de lutas e de artes marciais  e a sites de relacionamento e a jogos de computador, drogas, “pegas” de automóveis, mil namorado(a)s, sexo inseguro, desocupação, vazio e tédio ... O(a) jovem que não gosta deste “samba” nem sempre é um mau sujeito e, dificilmente, é ruim da cabeça ou doente do pé. É que esse/essa jovem tem um pé ou os dois pés no futuro. Escolheram não serem iguais só para serem aceitos; entre ser um “jovem” normal e sem surpresas, escolheram “envelhecer antes que fosse tarde.

As características/fórmulas comuns aos jovens da reportagem da revista Veja (BETTI, 2010) são: Incentivo máximo para os estudos; esforço acima da média (“sempre saíram menos e estudaram mais que os colegas”): alta competitividade; hábito de planejar e medo zero. 

O jovem, pobre ou rico, negro ou branco, que não ‘curte’ esse samba muitas vezes e sem o saber está vivendo na pele, a emergência de um novo padrão de juventude e das expectativas sociais, sócio-econômicas e culturais do que venha a ser, do que deva ser jovem, juventude, nas próximas décadas. Esse pioneiro, ante todas as facilidades, imediatismo e jogos de sedução desse “samba”, está escolhendo as dificuldades, a visão médio e longo prazo e, também, a sedução proporcionada pela Educação; está escolhendo indicadores quali-quantis de conquista da cidadania pela Educação como: Estudo, Desejo, ambição, espírito de competição, Conhecimentos e Dinheiro por exemplo.

Se é normal que um jovem goste e se entregue a esse “samba”, será patológico, doente, um jovem que não o faça? Claro que não.

Mais do que nunca, hoje o Estado tem que injetar esses indicadores – Estudo, Desejo, Ambição, Espírito de competição, Conhecimentos e Dinheiro - diretamente na veia das comunidades pobres, desassistidas e, de todas as formas, excluídas.


Educadores de todo Brasil, uni-vos!



REFERÊNCIAS


ANDRADE, Eliane Ribeiro e FARAH, Miguel (Neto).
Juventudes e trajetórias escolares: conquistando o direito à educação. ABRAMOVAY, Miriam, ANDRADE, Eliane Ribeiro e ESTEVES, Luiz Carlos Gil (org). Juventudes: outros olhares sobre a diversidade. 1ª ed. Brasília, UNESCO/SGPR/SNJ/ME, 2007.

BERNARDI, Bernardo. Introdução aos estudos etno-antropológicos / Introduzione agli studi etno-antropologici / Trad. A.C. Mota da Silva. Lisboa, Ed. 70, São Paulo: Martins Fontes, 1974.

BETTI, Renata. Apostas nota 10. Veja. São Paulo, 15 de dezembro de 2010, pp. 128-138.

BRASIL, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Síntese de Indicadores Sociais – 2008. Brasília, DF, 2009.

CALLIGARIS, Contardo. Educar frustrando? In: Folha de São Paulo. São Paulo, 16 de dezembro de 2010, p. E10.

DAVIS, Allison. A socialização e a personalidade juvenil. BRITO, Sulamita de (org). Sociologia da juventude II. Rio de Janeiro: Zahar, 1968.

GENNEP, Arnold van. Ritos de passagem ... / Les rites de passage/ Trad. Mariano Ferreira. Petrópolis, Vozes, 1977.

ISTOÉ. O brasileiro do século – 7, Educação, Ciência e Tecnologia. São Paulo, s.d.

TURNER, Victor W. O processo ritual: estrutura e anti-



















estrutura. Petrópolis, Vozes, 1979.



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