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JOVENS URBANOS, “ENVELHEÇAM DEPRESSA” SE DESEJAM VENCER PELA EDUCAÇÃO (2)
Vicente Deocleciano Moreira,
Maria da Luz Silva,
Edna Lucia do Nascimento Macedo.
(Continuação)
(Continuação)
1.1. O filho pródigo
São os mais variados possíveis, os exemplos que traduzem as posturas da sociedade em relação à juventude: a história bíblica do retorno do filho pródigo; a eterna juventude buscada a preços elevados e com sacrifício da saúde; ditados populares como “se a juventude soubesse e se a velhice pudesse; além de frases de celebridades como “A juventude é uma coisa maravilhosa, que pena desperdiçá-la com os jovens” (Bernard Shaw – escritor irlandês) ou “Jovens, envelheçam depressa antes que seja tarde!” (Nelson Rodrigues – escritor e dramaturgo brasileiro).
Partidos políticos de ontem (nazistas, fascistas) e de hoje apostam no entusiasmo da juventude para divulgar suas ideologias... São tantos os exemplos, e eles nada têm de inocentes. Ao contrário, tentam esconder a visão, a opinião que a sociedade, as estruturas de poder e da economia, dos adultos e idosos têm sobre a juventude, sobre os jovens.
Partidos políticos de ontem (nazistas, fascistas) e de hoje apostam no entusiasmo da juventude para divulgar suas ideologias... São tantos os exemplos, e eles nada têm de inocentes. Ao contrário, tentam esconder a visão, a opinião que a sociedade, as estruturas de poder e da economia, dos adultos e idosos têm sobre a juventude, sobre os jovens.
O filho pródigo, ou seja, o esbanjador de dinheiro, exige do pai a antecipação de sua parte na herança e sai pelo mundo. Em vez de economizar, multiplicara herança e ficar rico – como teria sido uma atitude classificada como ‘adulta’, ‘madura’, ‘responsável’ - o jovem segue esbanjando a herança com mulheres e pagando comida e a bebida para desconhecidos que encontra pelo caminho. O dinheiro acaba, e arrependido, ele volta para casa, e recebe o perdão do velho pai.
1.2. Idade, juventude e relação saber & poder
Há um dito popular que lamenta: “Se a velhice pudesse e a juventude soubesse…” À juventude é sempre atribuído o poder (da virilidade, do fazer atlético e sexual), mas não do saber. A juventude é uma das poucas fases da vida em que o poder está, em princípio, dissociado do saber. No entanto, mesmo sem que a sociedade saiba ou não queira saber, o fato é que a juventude domina um saber peculiar sobre si mesmo, sobre seus pais, sobre o mundo. Ao mesmo tempo em que a imaginação das pessoas, o imaginário social nega que a juventude ao mesmo tempo tenha saber e poder, essas mesma pessoas (contraditoriamente) repetem que está nos jovens o futuro do país e a esperança da melhoria ética das instituições políticas. Essas pessoas não só sentem saudade, mas exigem a volta, às ruas, dos “caras pintadas” que pediram, nas ruas, o impeachment do ex- Presidente da República Fernando Collor de Melo.
No pensamento corrente, no cotidiano vivido, porém, o saber é pensado como qualidade exclusiva dos mais velhos, cujos corpos e o raciocínio já não funcionam tanto quanto antigamente, mas continuam considerados os ‘sábios’, os poderosos da sociedade na política, nas empresas... Questionando opiniões como estas, uma pesquisa da Universidade da Virgínia (nos Estados Unidos), sobre a relação entre a capacidade cognitiva e as fases da vida (publicada na revista Veja, 21 de outubro de 2009) traz a seguinte contribuição:
a) A partir dos 22 anos de idade, a velocidade de raciocínio, a visualização espacial e a capacidade de estabelecer conexões lógicas entre os fatos estão em seus melhores momentos e não se repetirão com tanta eficiência;
b) A maioria das descobertas matemáticas foi obra de cientistas com menos de 27 anos. O físico e matemático Albert Einstein publicou a Teoria da Relatividade aos 26 anos. James Watson descobriu a estrutura do DNA aos 25;
c) Depois dos 27 anos, o raciocínio começa a ficar mais lento embora não perca a exatidão. Porém, a visualização espacial já não é tão eficiente com antes.
d) Por volta dos 40 anos, a memória começa a decair; aos 60 anos, começa a diminuir a capacidade de acumular conhecimentos.
Pensando bem a partir dessas informações podemos concluir que (apesar de um determinado discurso tentar ‘esvaziar’ o saber da juventude), de um ponto de vista das ciências da aprendizagem, a verdade é que quanto mais se é jovem maior é a capacidade e a velocidade de raciocínio e de acumular conhecimentos; quanto mais idade, menores são tais capacidade e velocidade e mais difícil o acúmulo de conhecimentos.
1.3. A condição de liminaridade
O(a) jovem adolescente em geral, está numa incômoda condição de liminaridade (de limite), independentemente dos ritos de passagem da cultura de que faça parte. (TURNER, 1974, GENNEP, 1977). Tendo já cumprido o rito de separação que o afasta da infância ainda não realizou o rito de agregação à condição de adulto. Não são tolerados determinados comportamentos que os adultos classificam como ‘infantis’, tanto quanto são aceitas somente atitudes que o(a) jovem deve assumir, adotar, quando for adulto.
1.4. Juventude e beleza
Quanto mais distantes, no tempo e no espaço, da Grécia Antiga, mais elegemos as imagens do jovem Apolo e da jovem Afrodite como padrão de beleza universal. A ironia sofisticada de Shaw e o duplo sentido da frase de Rodrigues não conseguem esconder a saudade que muitos têm dos tempos de juventude.
A juventude é o próprio ideal de saúde física e mental. Quando alguém chega à idade dos 40, 45 anos em diante – ou até mesmo antes disso! -, é comum que médicos, mídias (jornais, TV, revistas...) e livros recomendem, e praticamente nos obriguem, a fazer exercícios físicos diariamente e sob recomendação médica, adotar dieta balanceada, evitar consumo excessivo de carne vermelha, não trabalhar em excesso, praticar atividades de lazer, não fumar, beber álcool moderadamente, otimismo diante da vida, evitar estresse, etc. Enfim, fazer coisas que têm a ver com o ideal do vigor juvenil, mas de execução difícil para quem já está nos cinqüenta.
Quando uma emissora de TV ou qualquer outro órgão de imprensa faz reportagem sobre a saúde, vitalidade e a perspectiva de longevidade de quem hoje (2011) tem 60 anos de idade, essas mídias dão expressivo destaque para o corpo esbelto, para pessoas fazendo exercícios, praticando surfe. Essas imagens, que tentam “vender” saúde e vitalidade, têm como padrão a juventude. A estas pessoas com 60 anos ou mais é negado, pela mídia, um padrão próprio (para a idade) de saúde e disposição. Daí todos dizermos que determinado/a idoso/a tem um ar “jovial” quando apresenta (ou aparenta mostrar) pele, energia, capacidade física e intelectual próprias dos jovens.
Sempre que falamos em juventude, no singular, podemos correr o risco de idealizar o jovem e de generalizar para todos os jovens as idéias que, comumente, fazemos sobre o que é ser jovem, o que é e o que faz a juventude. E, além de correr esse risco, esconder, ignorar ou ser indiferente às diversas formas de ser jovem, sobretudo em sociedades com fortes desigualdades sociais como o Brasil. Fazendo uso, mais uma vez, dos ditos populares, diremos que “os dedos das mãos são irmãos, mas não são iguais”. Dizemos que as mãos são a juventude e a condição bio-psíquico-sócio-cultural do ser jovem, em diversos tempos, culturas e lugares físicos e sociais. Cada dedo da mão, diferente do outro (mesmo quando se juntam as duas mãos), pode sugerir que existem diferentes jovens em condições de cultura, classe social, de nível de instrução e de poder aquisitivo.
A verdade é que nem todos/as os/as jovens: são gastadores (mesmo quando têm dinheiro), ou vivem no paraíso de felicidade e irresponsabilidade, entusiasmo desvairado e de alto consumismo em que às vezes imaginamos que eles/as vivem. Nem todos/as têm o poder, a força atlética e a saúde que os corpos das estátuas de Apolo e Afrodite parecem “dar” e “vender”. Nem todos/as os jovens têm roupa de grife, casa e comida, são brancos/as, ricos/as, cursam as melhores escolas ou faculdades, dispõem de note book, internet, de TV de LCD ou dos mais confiáveis e caros serviços de saúde. Nem todos/as já foram (ou irão) à Disneylândia ou não precisam trabalhar para viver.
Alguns meninos e meninas comemoram o Dia das Crianças (no Brasil, 12 de outubro) leves, livres e soltas, comendo pizzas e ostentando presentes caros e vistosos. Mas há crianças que “comemoram” esse dia, nas penitenciárias, na mesma cela onde estão também presas suas mães, sem comida ao menos digna, numa vida sem presentes, sem presente e sem futuro.
Nem todos/as jovens estão protegidos/as na prática concreta da vida social, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. A juventude não usufrui, igualmente, dos direitos sociais que configuram a nossa idéia contemporânea de cidadania: saúde, educação, habitação, segurança e proteção contra atos de violência, de cooptação pelo narcotráfico, de abusos sexuais, acesso ao direito à alimentação saudável, à dignidade...
Diante de tantas diferenças e diversidades num universo só aparentemente igual que é a juventude, é melhor e mais realista falar em juventudes, no plural – porque ela é plural, diversificada e a cidadania não tem sido conquista de todos/as os/as jovens.
1.5. Juventudes, educação e conquista da cidadania
É na educação que as profundas desigualdades entre jovens, no Brasil, têm maior visibilidade. Andrade e Farah (2007, p. 55-56) trazem importante contribuição ao nosso texto instrumental:
Pensar no processo de juventude e em condição social juvenil significa, necessariamente, pensar em um conjunto de processos de diferenciação. No Brasil, a situação dos jovens perante o sistema educacional é um deles. A escolaridade, relacionada com a faixa etária, opera importantes diferenciações juvenis, especialmente se cotejada com a situação de vida das famílias dos jovens – determinada, principalmente, pelo status socioeconômico -, com sexo, cor, local de moradia, clivagens intergeracionais etc. Sem dúvida, não é possível se pensar em juventude como uma categoria independente do contexto no qual ela toma sentido (CHAMPAGNE, 1996). Assim, o processo de escolarização constitui hoje, sem dúvida, um espaço importante de sentido, que explicita, de forma incisiva, desigualdades e oportunidades limitadas que marcam expressivos grupos de jovens brasileiros. Ao mesmo tempo, é um espaço fundamental de reflexão e luta por direitos.
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(Continua segunda-feira, 3 de outubro/2011)
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