URBANISMO E MANIPULAÇÃO POLÍTICA
Luiz Carlos Costa
[fonte – jornal Folha de S. Paulo - São Paulo (SP – Brasil),14 DE MAIO DE 2012, p. A5]
Em 1988, já sabíamos que os
interesses particulares fariam tudo para dominar os planos diretores,
permitindo projetos muito adensados e elitizados
É possível salvar as grandes
cidades brasileiras da crise profunda que as assola.
Para isso, a sociedade,
lançando mão de todos os recursos que hoje pode mobilizar, tem de implantar
uma política de desenvolvimento urbano competente, para transformar
estruturalmente o processo pelo qual as cidades são produzidas, apropriadas e
utilizadas, submetendo-o a objetivos e critérios democraticamente escolhidos.
Foi com essa perspectiva que
segmentos mais conscientes e responsáveis da sociedade trabalharam desde a
década de 1980 para introduzir na Constituição de 1988 dispositivos que
tornaram obrigatória em cada cidade a instituição de planos diretores que
pudessem cumprir essa missão, caso fossem elaborados e aprovados com a mais
plena e efetiva participação popular.
Essa condição era essencial,
pois todos sabíamos que as forças econômicas e políticas dominantes do
processo urbano local tudo fariam para dominar o próprio plano diretor a fim
de que ele acabasse servindo a seus interesses particulares.
Mesmo que contrariando os
objetivos e critérios -sociais, econômicos, ambientais e de governabilidade-
que o conjunto da sociedade escolhesse como prioritários.
No caso de São Paulo, essas
investidas se concretizaram através de manobras políticas em favor de duas
categorias de agentes dominantes do processo urbano.
De um lado, os agentes
econômicos -notadamente empreendedores imobiliários- decididos a maximizar
seus ganhos com a promoção de projetos tão adensados e elitizados quanto
possível.
De outro lado, os ocupantes de
cargos públicas decididos a associar os seus mandatos a obras e programas de
grande visibilidade que atendam a sua clientela política e os agentes
privados que viabilizam as suas campanhas.
Essas categorias têm se
organizado reservadamente em São Paulo, de forma a gerar proposições de seu
interesse comum e imediato, que possam ser rapidamente aprovados e
implementados como fatos consumados, sem que a coletividade atingida possa
discuti-los.
São proposições interesseiras
que buscam, entre outros objetivos:
- Aumentar os índices de
aproveitamento e ocupação dos terrenos de cada zona;
- Ampliar a outorga onerosa do
direito de construir acima do permitido pelo zoneamento;
- Reduzir o quanto possível as
zonas especiais destinadas à habitação popular,
à preservação ambiental e aos equipamentos públicos necessários;
- E como ampliar e multiplicar
as chamadas operações urbanas, que possibilitam ao setor imobiliário promover
a seu critério a reurbanização de grandes áreas com projetos de potencial
construtivo muito ampliado.
Em todo esse processo, a sociedade
é vitimada por uma condução parcial, autoritária e manipuladora do Executivo
e do Legislativo municipais, que são os poderes que deveriam preservar o
direito de todos os cidadãos de participarem livre e conscientemente do
processo de planejamento de sua própria cidade.
Diante da obrigação legal de um
novo plano diretor já no próximo ano, é fundamental que sua formulação passe
a ser programada de forma competente e democrática, com objetivos e
princípios claros e com um método que assegure a definição de políticas
públicas eficazes e viáveis, aprovadas e fiscalizadas pelos cidadãos e suas
associações.
Interessa portanto a todos os
eleitores conhecer já os compromissos e diretrizes dos candidatos nas
eleições municipais para a condução do plano diretor e, especificamente, para
a neutralização das manobras políticas montadas para desvirtuá-lo e impedir a
participação popular.
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LUIZ CARLOS COSTA, 76, professor aposentado da
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, é consultor em planejamento
urbano e diretor do Movimento Defenda São Paulo
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