quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Rosa Lima - Ressignificar ... (2 - FINAL)

Ressignificar o subúrbio para ressignificar a cidade (2 - FINAL)


Metrô de superfície

Há anos estudioso do subúrbio carioca, o arquiteto Sérgio Magalhães apontou uma situação paradoxal: o grau de dependência da cidade para com os subúrbios da Zona Norte é imenso. No entanto, cada vez menos políticas e programas são destinados a eles.

"A Zona Norte é o coração da cidade. É ela que articula a Zona Oeste, a Baixada Fluminense e de certo modo também o Centro e a Zona Sul. Estrategicamente, ela tem uma expressão crucial para o desenvolvimento do conjunto da cidade metropolitana. A pergunta que me faço é por que, sendo tão central do ponto de vista econômico, social, político e cultural, ela continua tão ausente das políticas públicas?".

Segundo Sérgio Magalhães, por sua condição estratégica e geográfica, é a Zona Norte que consegue fazer a costura de toda a cidade. Mas viveu um processo de degradação intenso, com a perda da condição industrial, que se traduziu no completo abandono da região, expresso sobretudo pela decadência da ferrovia.

Numa região em que esse transporte é estruturador, a rede ferroviária chegou aos anos 90 com uma participação de 10% no transporte urbano do que tinha 15 anos antes. Mesmo com a privatização, está muito aquém de sua potencialidade. Hoje, o sistema representa um quinto do que foi na era Geisel, quando poderia ser o dobro.

"Será necessário construirmos uma avaliação política da Zona Norte suburbana como estratégica para o desenvolvimento do Rio nas próximas décadas a partir de elementos centrais possíveis de serem enfrentados. O transporte ferroviário é o mais expressivo deles. Transformar os trens em metrô de superfície é o pontapé inicial do processo de revitalização do subúrbio. A estrutura está pronta, não custa caro, e vai permitir elevar imensamente a qualidade de vida na região, com consequências positivas para a cidade toda".

Cidade policêntrica


Todo o debate que se seguiu às apresentações girou em torno de uma visão distorcida sobre o subúrbio que acaba por penalizá-la ainda mais. "Estou convencido de que o problema de valorização do subúrbio é mais simbólico e cultural do que econômico. Na Maré circula mais dinheiro do que em Bonsucesso, mas ali não há nenhuma agência bancária. E não é porque é favela tampouco. A Rocinha também é e os bancos estão lá", disse Jailson Silva.

Com ele concordou o empresário Daniel Plá, segundo quem os pontos comerciais mais disputados e valorizados do Grande Rio são, nesta ordem, os calçadões de Campo Grande, Nova Iguaçu e Caxias. "O dinheiro está lá. Até que ponto a máfia dos transportes impede o acesso dessas regiões a serviços de qualidade?", questionou.

O arquiteto Flávio Ferreira chamou atenção para a relatividade do que consideramos belo. "Beleza se constrói culturalmente. Precisamos descobrir e criar novas belezas na Zona Norte, que até o final do século19 era a região mais bela da cidade, onde se instalou a nobreza e o Império fez seu palácio", disse, sugerindo a criação de um grande parque em Gericinó ou um novo aeroporto na base aérea de Santa Cruz. "É preciso distribuir a beleza de maneira mais equânime entre as regiões".

Foi exatamente essa visão que, segundo o secretário estadual de Ciência e Tecnologia, Luiz Edmundo Costa Leite, motivou a criação do Museu da Ciência e da Vida em Duque de Caxias, a ser inaugurado em junho. "Isso é um estímulo para que outras iniciativas aconteçam na região".

O ex-deputado Márcio Fortes lembrou que as 18 estações de metrô inauguradas nos últimos quatro anos em São Paulo foram resultado de um conceito de planejamento que entendeu que era preciso descentralizar a cidade. "Isso é perfeitamente aplicável no Rio", disse.

Os dois candidatos ao Senado presentes ao debate também se manifestaram. Aspásia Camargo lembrou da importância de se investir no conceito de cidade policêntrica, e Lindberg Farias falou da necessidade de se planejar a Região Metropolitana para os próximos 20 anos.

Para André Urani, é essa visão estendida de subúrbio, como a canção de Chico Buarque, que faz sentido hoje. Ela engloba Realengo, Meriti, Nova Iguaçu, São Gonçalo e toda a Região Metropolitana. Mas lembrou que não temos ainda uma instituição que seja capaz de formular e administrar seu desenvolvimento. "Qual é governança para isso? Quem faz, quem decide? Como se planeja 30 anos adiante? Quando sediou os Jogos Olímpicos, Barcelona criou uma agência de desenvolvimento privada. E nós, que ferramentas temos?".

Sérgio Magalhães finalizou lembrando a importância da Olimpíada como instrumento de desenvolvimento da cidade. "Concentrá-la na Barra é um equívoco que só vai nos levar a mais dispersão e destruição. Hoje temos uma chance de reverter essa decisão e alocar grande parte dos equipamentos olímpicos na Zona Portuária. Apostar no Centro Histórico como um lugar de futuro e requalificar a Zona Norte são pontos essenciais na retomada do desenvolvimento do Rio".

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