Sem pedir licença aos deuses
Pode rim
ar/ amor e dor,/ pois dor e amor/ dão belo par. // Mas quem for dar,/ em vez de amor,/ somente dor,/ não deve amar.» (Marcelo Sandmann) *
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Angélica Torres Lima
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Angélica Torres Lima
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Yolanda Mohalyi (1909-1978), húngaro-brasileira, Figura feminina
AGNI
Essa sanha titânica que me leva a pôr fogo no mundo sem pedir licença aos deuses essa sanha que alastra a língua ardente do arco-íris na manhã do logos toma de Prometeu a tocha e com ela varre o forro o foro o fundo da casa os porões do corpo os pilares da palavra lava com a lava embaixo em redor e sobre.
Yolanda Mohalyi, Avenida São João (anos 30)
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Sem pedir licença aos deuses
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Angélica Torres Lima
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Yolanda Mohalyi (1909-1978), húngaro-brasileira, Figura feminina
AGNI
Essa sanha titânica que me leva a pôr fogo no mundo sem pedir licença aos deuses essa sanha que alastra a língua ardente do arco-íris na manhã do logos toma de Prometeu a tocha e com ela varre o forro o foro o fundo da casa os porões do corpo os pilares da palavra lava com a lava embaixo em redor e sobre.
Yolanda Mohalyi, Avenida São João (anos 30)
CINZENTA
Observe o cérebro doutor. O traçado é inteiro labirinto. Que caminho faço pra dele chegar onde preciso? Antes tomo absinto? Pela porta do peito entreaberto avisto um campo menos íngreme. Se por ela atravesso alcanço onde me espero fundo um reino e me ilumino?
Yolanda Mohalyi, Jovem mãe (1937)
CÓSMICA
Só lhe dão o sol no chão
semente de ardente urdidura vã iluminura
e a loba anseia as luas cheias da ursa maior.
Yolanda Mohalyi, Menino (1947)
RETIRO
Ai o tempo vivido entre raízes e grimpas de flamboiãs. O pequi a jabuticaba a goiaba perfumados. De ninguém o amanhã. O dia aceso no alpendre de hortênsias antúrios capim santo. Tardinha e madrugada a mesma luz de lampião nos augúrios do campo. O anel de noiva enterrado no pasto e a boiada desandada no desfile de sete de setembro. Mas ouviam-se em hi-fi as big bands.
Yolanda Mohalyi, Violão
ECOS
E o vento maestro de folhagens te incorpora pai eu sinto e ouço a sinfonia da fazenda na cidade à beira-mar. Algaravia agoravia agorouvia o seu fantasma a conversar comigo em meio à suave orgia de rã sapo e jia em tarde vegetal.
Yolanda Mohalyi, Autorretrato (1944)
CERCANIAS
O silêncio sorve a poeira da paisagem ancestral e ela dando adeus ilhada em seu curral federal. Prisioneira de prancheta prosa parafernália política só entre o céu encarnado e as ikebanas contorcidas sabe lá a sua sina traçada de Cruls a Costa e cruz e sonha-se concreto de olhos d'águas e caliandras veredas e campos de lírios. Chora o vento uivando com Dilermando e o peixe apartado d'água fria (e agora Cerrado sem a sua companhia?)
Ao longe só seriema com seu agourento tristíssimo canto.
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